Por: Renato Drummond Tapioca Neto
O nome de Maria Antonieta está associado a muitos elementos, especialmente à moda. Apesar de já ter possuído o maior guarda-roupas da Europa, poucos vestidos da rainha sobreviveram à Revolução Francesa. Pares de sapatos, corpete, pedaços de fitas, são tudo o que restaram da mulher mais elegante de seu tempo. Entre as poucas peças de roupa, podemos destacar uma chemise que ela utilizou durante os meses em que permaneceu na Conciergerie e que hoje se encontra exposta no mesmo local. Contudo, o que pouca gente sabe é que em Avignon (França), mais precisamente na Métropole des Doms, existe uma túnica de seda na cor roxa, guardada secretamente por séculos, que teria sido costurada a partir de um robe utilizado pela rainha antes de sua execução, em 16 de outubro de 1793.
A Sacristia da Métropole des Doms, localizada a poucos passos do Palácio dos Papas, possui muitos segredos. Entre eles, a túnica feita com o suposto robe de Maria Antonieta. O artefato ficou escondido por muito tempo das vistas dos curiosos, numa gaveta próxima ao guarda-roupas dos clérigos. O padre Bréhier, guardião do “tesouro”, gentilmente concordou em divulga-lo para os tabloides, sem saber ao certo como o vestido da rainha teria parado em Avignon. De acordo com as afirmações locais, trata-se do robe que Antonieta utilizou nos dias 15 e 16 de outubro, durante o seu julgamento. Após se preparar para a lâmina da guilhotina, trocando sua roupa de viúva por um simples vestido branco, o que restou dos pertences da vítima foram doados para instituições e irmandades religiosas. Entre os itens, o robe que hoje se encontra entre as posses da Sacristia da Métropole des Doms.

O vestido branco foi possivelmente a única peça de roupa que Maria Antonieta tinha à sua disposição para a sua execução, e não uma escolha deliberada para demonstrar apoio à monarquia.
Muitos interpretaram a escolha da rainha em utilizar um vestido branco no momento de sua execução como um último ato de apoio à monarquia e à fé católica. já que o branco também seria a cor dos reis e dos mártires. Na verdade, as opções de roupa de Maria Antonieta eram extremamente limitadas na prisão. O vestido branca era possivelmente a única peça limpa que ela tinha disponível no momento. Após ter se trocado com a ajuda da criada Rosalie Lamorlière, ela enfiou suas vestes de viúva num buraco que havia na parede da cela e em seguida saiu de encontro ao carrasco, que estava preparado com a tesoura para lhe cortar os cabelos. Após a morte da rainha, o Tribunal Revolucionário tomou todo o cuidado possível para que seus objetos não fossem transformados em relíquias pelos monarquistas. Assim, as peças de roupa da soberana foram doadas anonimamente, junto com vestidos de outras presas mortas, para que ninguém soubesse a quem elas teriam pertencido.
A história do suposto robe da rainha é, assim, um pouco confusa. Segundo nos conta o padre Bréhier, o robe teria sido pego por Rosalie, que o manteve consigo até o ano de 1799, quando deixou de trabalhar na Conciergerie. Após abandonar as dependências da prisão, ela teria passado o robe para a guarda do abade Veran, que residia em Paris. No início do século XIX, o bispo de Avignon, Jean-François Périer, adquiriu a peça, para utiliza-la na restauração de uma relíquia da Sacristia da Métropole des Doms, danificada durante a Revolução. Desde então, a túnica feita a partir do robe da rainha é mantida em completo sigilo, sendo exposta apenas em ocasiões raras. A última vez teria sido por ocasião da morte do Papa João Paulo II, em 2005.

O Padre Bréhier mostra a túnica feita a partir do rode utilizado por Maria Antonieta.
Porém, a autenticidade da peça gerou alguma dúvida. Durante o século XIX, muitas pseudo-relíquias de Maria Antonieta foram comercializadas por antiquários e oportunistas, como a lâmina da guilhotina que a decapitou e que hoje se encontra exposta em Londres, no Museu Madame Tussauds. Contudo, a riqueza do tecido sugere que ele tenha pertencido a alguém importante. Sabe-se que o roxo era uma das cores preferidas de Maria Antonieta, muito utilizado por ela entre os anos de 1790 e 1793. Também era uma cor associada ao luto, que Antonieta manteve após a morte de Luís XVI, em 21 de janeiro de 1793. A Sacristia da Métropole des Doms, por sua vez, clama a autenticidade da peça. Quando questionado o porquê de não terem revelado o tecido antes, o padre Bréhier respondeu: “Não era nossa intenção. A Sacristia não é um museu”. Seja como for, o “achado” oferece um testemunho a mais sobre os últimos dias da rainha da França.
Fonte: La Provence – Acesso em 21 de agosto de 2017.