PARTE II.I – Os rituais da corte francesa
por: Renato Drummond Tapioca Neto
Acompanhar os jovens príncipes ao leito conjugal era apenas um dos muito excêntricos costumes da corte francesa. Todas as manhãs a Delfina era despertada por um grupo de nobres mulheres que dariam início à “cerimônia da vestimenta matinal”. Como uma boneca, Maria Antonieta era despida pelo indivíduo de maior título presente ali no quarto e não poderia tocar em nada, pois o privilégio da entrega de determinado objeto a uma Delfina cabia à nobreza de sangue real. Deveria, por tanto, estar atenta a todas as entradas e saídas do aposento para não deixar de fazer a devida mesura quando necessário e para o constrangimento de Maria, isso aconteceria em todas as manhãs. Após a cerimônia, era o momento do café da manhã com o Delfin, que nos primeiros anos de casamento era uma figura bem apática para com sua esposa, limitando-se a alguns comprimentos formais ou diálogos sem importância. Depois da refeição, a Delfina era acompanhada à missa pela Condessa Noailles, responsável por seu comportamento na corte (dizem que a condessa era tão obcecada por manter Maria Antonieta nos padrões aceitáveis para uma Delfina – modos, religiosidade e vestuário – que ela a apelidou de “Madame Etiqueta”).
PARTE II.II – Poucos amigos e alguns inimigos

Princesa de Lamballe
Maria Antonieta não tardou em arrumar uma companhia agradável para animar a tediosa vida que estava levando em Versalhes. Desta vez, me refiro à Maria Luisa de Saboia, Princesa de Lamballe, que porventura, tornar-se-ia uma das melhores amigas da Delfina. As duas provavelmente se conheceram durante uma das cerimônias da vestimenta matinal e tão logo começaram a passear juntas, ir à missa e até fazer compras acompanhadas uma da outra como em qualquer relação de amizade. Entretanto, a tranquilidade da jovem, além de ser interrompida pelas nobres futriqueiras da corte, era constantemente ameaçada por uma figura demasiadamente detestada pelos cortesãos, Madame Du Barry, a amante de Rei (para que ela pudesse frequentar a corte, Luís XV tratou de arrumar-lhe um título de Condessa). De acordo com Antonia Fraser,
… A presença da Du Barry na corte constituía um problema, mas somente caso se permitisse que virasse um problema. A moral em Versalhes não era levada tão a sério. Os nobres casavam-se jovens, seus casamentos eram mais ou menos arranjados e depois escorregavam graciosamente para relacionamentos extraconjugais, em geral tolerados contanto que conduzidos com suficiente elegância de estilo. […]. Neste ambiente, a presença por si só de uma maîtresse-en-titre (amante titular) real dificilmente faria torcer o nariz da maioria dos cortesãos franceses, acostumados como estavam a um elenco variado de tais damas durante a maior parte do longo reinado, ainda que a origem pouco respeitável da Du Barry fosse mais difícil de aceitar… (FRASER, 2009, p. 109).

Jeane Bécu, Madame Du Barry, por François Hubert Drouais (1770).
À medida que Maria Antonieta não correspondia às tentativas de Du Barry de fazer amizade, a contrariedade da rival aumentava, chegando ao ponto de reclamar com próprio Rei na intenção de que Delfina lhe dirigisse a palavra. Maria Antonieta, em contrapartida, também a detestava e sentia-se ofendida de estar na presença de tal mulher. Como se isso não bastasse, a questão da consumação do casamento constituía um tormento para ela. Sua mãe enviava-lhe periodicamente cartas insistindo para que usasse de todo o seu charme e beleza a fim de estimular o delfim à prática sexual e o fato de a sua cunhada, a Condessa d’Artois, ter concebido primeiro que ela só fez aumentar o seu desespero.
Referências Bibliográficas:
FRASER, Antonia. Maria Antonieta. Tradução de Maria Beatriz de Medina. 4ª edição. Rio de Janeiro: Record, 2009.
LEVER, Evelyne. Maria Antonieta: a última rainha da França. Tradução de S. Duarte. 1ª edição. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.