PARTE VI – O Martírio da Rainha
Por: Renato Drummond Tapioca Neto
Ficou claro até agora que os franceses estavam a procura de alguém em que pudessem despejar a culpa pela miséria no país e Maria Antonieta era a pessoa certa no momento certo. Com a notícia da queda da Bastilha, Versalhes já não era mais um lugar seguro para a família de sangue real. A Rainha então ordenou que todas as suas amigas ao lado dos príncipes e princesas do sangue, deveriam partir dali imediatamente. Ela e Luís XVI, por hora, recusaram-se a deixar o palácio, mas em cinco de outubro do mesmo ano, a população de Paris deixou a cidade e partiu ao encontro dos soberanos para exigir-lhes farinha (o episódio ficou conhecido como a marcha das mulheres do mercado). Têm-se então a imortalizada cena do filme de Sofia Copola, quando a população enfurecida ao redor do palácio gritava pela rainha e esta, em toda sua majestade, dirigiu-se à sacada dos aposentos do rei e se curvou para os súditos, que emudeceram diante da figura da monarca. Por dois dias, a família real, poucos nobres e alguns criados ficaram sitiados em Versalhes até que o Rei cedeu às reinvidicações e se fixou no palácio das Tulheiras (Paris). Posteriormente, o conde Fersen tentara ajudar o casal real ao organizar uma fuga para ambos, mas infelizmente eles foram encontrados e detidos (o episódio ficou conhecido como a “Noite de Varenes”).
Em setembro de 1791, Luís XVI teve de prestar juramento à primeira Constituição francesa, por meio da qual a classe burguesa era a maior favorecida, encerrando assim os trabalhos legislativos da Assembléia Constituinte de 1789. Vendo o desatino em que se encontrava, a Rainha tratou de apelar para os membros mais proeminentes da Assembléia, objetivando o reencargo dos poderes absolutos para seu marido, mas não logrou êxito. Contudo, o historiador Munro Price esclarece o seguinte:
A política que surgiu dessa traumática experiência foi falsa, para não dizer o mínimo. Se publicamente proclamavam sua fidelidade à constituição a fim de tranquilizar o povo francês, por trás da cena o rei e a rainha desenvolveram um esforço organizado a fim de persuadir as potências europeias a exercer pressão diplomática sobre a França, apoiada pela ameaça de força militar. As potências deveriam fazer suas exigências centrais – que a assembleia garantisse respeitar obrigações de tratados franceses anteriores e que a família real fosse posta em liberdade. Seu instrumento seria um “congresso armado” dos estados atingidos, apoiado por tropas, que se reuniria em um local adequado perto da fronteira francesa, como Aix-la-Chapelle (PRICE, 2007. p. 240).
A rainha pediu ajuda de seu irmão, o Imperador Leopoldo II, para que este invadisse a França e restaurasse a ordem local, mas os franceses em pouco tomaram nota da trama, que julgaram como um ato de traição do rei para com a nação. Em 10 de agosto de 1792, o palácio das Tulheiras foi assaltado por uma multidão furiosa e a família real foi obrigada a se refugiar no prédio da assembleia. logo depois foram transferidos para a Torre, anexa ao palácio do Templo. O ódio contra a nobreza atingira seu cume quando os revolucionários atacaram e assassinaram a Princesa de Lamballe. Sua cabeça, enfiada em uma lança, foi levada até a janela da cela de Maria Antonieta, que desmaiou antes de por os olhos naquilo.

Maria Antonieta, viúva aos 37 anos.
Pouco tempo depois, Luís XVI foi separado dos demais membros da sua família. Julgado culpado de crimes contra a nação francesa, ele foi decapitado em 21 de janeiro de 1793. A Rainha passou então a ser chamada de “Viúva Capeto” (nome que deriva dos ancestrais de seu marido) e em pouco lembrava a exuberante figura que um dia fora, tornando-se uma mulher reclusa, com poucos amigos e afastada dos filhos. Em agosto daquele mesmo ano, ela fora levada transferida para a Conciergerie. Seu julgamento procedera em 14 de outubro de 1793. O que o tribunal veria naquela infeliz ocasião, seria uma mulher de quase 38 anos, mas tão abatida que mais parecia uma sexagenária. Seus cabelos, outrora loiros e vistosos, haviam-se esbranquiçado e estava demasiado magra. No entanto, foram as caluniosas acusações testemunhadas contra a ré que mais surpreenderam: traição à pátria; adultério; relações homossexuais com a Princesa de Lamballe e a Duquesa de Polignac; e o pior de todos, submissão de seu filho a atos incestuosos. Quando questionada sobre este último, a Rainha respondeu: “A natureza se recusa a me permitir tal acusação feita a uma mãe”, e dirigiu-se para a multidão: “eu apelo a todas as mães que porventura aqui estiverem”. Nesse exato momento, o povo, mais precisamente as mulheres ali presentes, sem conseguir acreditar em tal absurdo, bradou em favor de Marie, mas seus protestos foram em vão.
Referências Bibliográficas:
FRASER, Antonia. Maria Antonieta. Tradução de Maria Beatriz de Medina. 4ª edição. Rio de Janeiro: Record, 2009.
LEVER, Evelyne. Maria Antonieta: a última rainha da França. Tradução de S. Duarte. 1ª edição. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.
PRICE, Munro. A queda da monarquia francesa: Luís XVI, Maria Antonieta e o barão de Breteuil. Tradução de Julio Castañon Guimarães. – Rio de Janeiro: Record, 2007.