Por: Renato Drummond Tapioca Neto
A princesa aguardava sentada no seu quarto, em companhia das outras aias, bordando, quando um pajem, vestido com as cores da casa do príncipe, penetrou no ressinto trazendo consigo uma notícia preocupante: o rei estava morrendo. Imediatamente, a princesa partiu para o quarto do marido, disposta a consola-lo e, ao mesmo tempo, esperar por novas informações sobre o estado de saúde do seu sogro. Uma metade da corte, composta por antigos duques e marqueses, estava estacionada nas portas do quarto do soberano, temendo por seu futuro, uma vez que a doença que matava o monarca também destruía o velho mundo daqueles nobres. Enquanto isso, os cortesãos mais novos e mais ambiciosos esperavam avidamente pela notícia da morte, para prestar seu juramento de lealdade ao novo monarca.
De repente, o arauto abriu as portas dos aposentos reais e gritou para aquele mar de pessoas que prestavam atenção: “o rei está morto. Vida longa ao rei”! Na mesma hora, todos saíram correndo para os aposentos do herdeiro, enquanto o corpo do seu pai era abandonando no leito. Um novo reinado se iniciava, repleto de expectativas, sonhos e medos. Muitos eram aqueles que acreditavam que dominariam o soberano recém-entronado, mas apenas uma pessoa conhecia os mecanismos necessários para isso: sua esposa, a nova rainha. Durante anos, a princesa agiu com calma e prudência. Foi um modelo de retidão feminina, caridade e bondade para todas as outras mulheres do reino. Mas por trás de suas ações, ela dava seguimento a um plano formado em sua cabeça no dia seguinte ao do seu casamento, quatro anos atrás: tornar-se indispensável nas coisas pequenas para então exercer influências nas grandes.
Sempre solícita, ela procurava ajudar o marido em tudo o que podia e se fingia de cega para os erros dele. A princesa havia compreendido que a arte de ser mulher era fazer os homens acreditarem que eram eles que estavam no comando, mostrando-lhes humildemente qual caminho deveriam seguir sem se gabar por tal feito. Em apenas três anos de casamento, ela conseguiu gerar um filho, cumprindo assim o papel principal para o qual fora designada. Agora, seu poder estava duplamente fortificado, pois não só era a mãe do herdeiro do trono como também rainha. O rei que mantivesse quantas amantes desejasse. Ela não se importava mais. Seu desejo estava unicamente concentrado na coroa e em como ela poderia exercer influência no governo. A criança parecia ser a chave perfeita para isso. Usando os interesses do filho como pretexto, a soberana exigiu fazer parte do Conselho Privado, o que não lhe foi negado.
Com efeito, os ministros do governo sabiam que o novo rei era um homem fraco e que o maior perigo que enfrentariam na administração do reino estava representado na pessoa da rainha. “Por que aquela mulher não se calava e ocupava seu tempo com frivolidades, como fizeram suas antecessoras”? Essa pergunta não desaparecia da cabeça dos outros conselheiros. Mas estes eram novos tempos, marcados por inovações no pensamento científico e artístico. Os papeis sociais dos homens e das mulheres sofreram profundas alterações nesta época de avanços e elas haviam se cansado de ocupar o lugar de subalternas.
Nesse caso, como barrar as pretensões da esposa do rei? A partir de então, dois partidos foram ganhando espaço na corte: de um lado, os que eram partidários da rainha, e do outro, os que eram contra a sua influência. As mentes mais astuciosas da oposição logo trataram de bolar um plano para tira-la do jogo. Assim, aos poucos as peças desse tabuleiro de xadrez foram movidas; peões avançavam e eram destruídos; torres, cavalos e bispos brigavam entre si, enquanto a rainha movia-se de um canto a outro, na tentativa de derrubar seus inimigos. O resultado dessa partida, porém, não seria favorável para nenhuma das personagens envolvidas nessa história.
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Você pode conferir esse conto na conclusão do livro “Rainhas Trágicas: quinze mulheres que moldaram o destino da Europa” (2016), publicado em Portugal pela Vogais Editora.