PRIORE, Mary Del. Condessa de Barral: a paixão do imperador. – Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.
O século XIX é conhecido por muitos como uma Era de grande avanço científico e tecnológico, mas também por romper tradições do passado sob uma máscara de romantismo, que, por sua vez, é o traço que define esse período. As concepções acerca de moralidade e religiosidade são acentuadas e concentradas especificadamente na figura da mulher. Com efeito, ela deveria personificar a donzela dos romances, inalcançável em sua pureza, e sempre à espera de um cavaleiro garboso que a conquistasse. Nesse contexto, o que aconteceria com a dama que fugisse a tais padrões de comportamento? Provavelmente ficaria à margem da sociedade como um agente banal da mesma. Era preciso, então, muita coragem e astúcia para enfrentar os preconceitos daquela época, e exemplos disso temos pouco nos arautos da História. Sem dúvida, uma das personalidades que mais se destacaram nesse aspecto, foi a da baiana Luísa Margarida Portugal e Barros, mais conhecida pelo seu título de nobreza: condessa de Barral.

Mary Del Priore
Apesar de serem grandes as quantidades de fontes que dispomos desta senhora, poucas publicações sobre a mesma merecem destaque. Entre elas, talvez a mais popular seja a de Mary Del Priore, historiadora bastante querida entre o grande público. Com uma escrita bastante acessível, Priore é marcada por sua interpretação romântica dos fatos, adicionando aos mesmos uma pitada de sexo, intrigas e amores proibidos. Essa fórmula, por sua vez, ela já empregou em outras de suas publicações, como é o caso de A carne e o Sangue (2012), que fala do triângulo amoroso envolvendo D. Pedro I, mais a esposa e a amante deste, a Imperatriz D. Leopoldina e a Marquesa de Santos, respectivamente. Todavia, em Condessa de Barral (2006), a autora nos conta a história de uma mulher que ela classifica como tendo sido a grande paixão de D. Pedro II, assim como alguém que viveu à frente de seu tempo. Descontando-se este último aspecto (pois, acredito que se uma pessoa apresenta um conjunto de características que permitem classificá-la como aquém de sua época, é porque a sociedade de então ofereceu brechas para que tal comportamento se manifestasse), o livro apresenta uma narrativa bastante leve e fácil de ler e interpretar.
Dividido em sete capítulos, a presente obra explora a vida de Luisa de Barros desde a sua infância na Bahia, passando pela juventude de requinte na Europa, até regressar ao Brasil e cair nas graças do Imperador. De menina criada em engenhos, a futura condessa de Barral receberia de seu pai, D. Domingos, uma instrução e estímulo para os estudos raro de se ver entre outras famílias abastadas da época. A educação dela, de acordo com Mary Del Priore, seria uma baliza importantíssima para a formação da mulher culta e agradável que Luísa um dia seria. É possível que seja esse um dos motivos pelos quais a autora a classifica como à frente do seu tempo, pois enquanto outras damas eram treinadas para as tarefas domésticas, a condessa se destacava pelos seus dotes intelectuais e femininos. Não obstante, só o fato de ela ter contrariado as ordens paternas e se casado com o homem que queria já a destaca entre as demais, que não podiam se rogar tal privilégio.
Provavelmente, uma das partes mais interessantes do livro é a reconstrução que a autora faz do clima político de Salvador no século XIX, especialmente nos anos que em que a família de D. Domingos viveu no Brasil. Nela, o leitor pode ter um vislumbre da infância tranquila de Luísa entre os Engenhos de São João e São Pedro, até o momento em que ela e seus pais e irmão são enviados à corte de Paris como representantes da coroa. Seria na Europa que a condessa de Barral passaria a acumular todos os dotes físicos e intelectuais tão fascinantes em uma mulher da aristocracia naqueles anos. A própria descrição que Mary Del Priore faz de sua biografada só faz confirmar ainda mais essa imagética: para além de uma inteligência aguçada, a Barral possuía um conjunto de características físicas bastante marcantes nas donzelas dos romances da Era Vitoriana, tais como os cabelos volumosos e escuros, pés pequenos, ou, como a própria autora salienta, “olhos de veludo” e “um sorriso enigmático de Gioconda”.

Luísa Margarida Portugal e Barros, condessa de Barral.
Percebam, então, como Priore se utiliza de uma linguagem própria da literatura para descrever a condessa. Acredito que esse é um dos maiores atrativos de seus livros aos olhos de quem os lê. Para ela, Luísa era a sedutora, que poderia ter quem quisesse. Nesse caso, é obvio que a apologia ao sexo na obra da autora, principalmente quando lemos acerca do relacionamento entre a condessa de Barral e D. Pedro II, se faz notória. Tal característica, por sua vez, é o elemento que marca a produção escrita de Mary De Priore e que chama a atenção ao público de leitores. Com efeito, observamos um crescente interesse por parte das pessoas no que se convém denominar “segredos de alcova”, ou seja, escândalos envolvendo altos membros da sociedade estejam eles vivos ou não. Sendo assim, como o segundo imperador do Brasil criou para si uma áurea imaculada de erudição, descobrir os desvios de conduta de tal personagem se torna quase que irresistível.
Sobre o caso extraconjugal de D. Pedro II, Priore se vale de muitas fontes, tais como cartas deste para a Condessa de Barral, mas nenhuma que explicite que o monarca mantinha relações sexuais com a amada. Estas acredita a autora, foram destruídas pelo casal, de modo que dispomos apenas da correspondência dos dois falando de seus assuntos cotidianos, do amor que sentiam um pelo outro (amor esse que não era puramente carnal, mas também de mentes) e da educação das filhas do casal de soberanos, uma vez que Luísa era preceptora das princesas no paço imperial. Diz a autora em sua obra que “o elo que os unia era muito forte. Ia muito além das ‘necessidades primitivas’, nome que se dava ao puro e simples desejo sexual. Era uma mistura sublime de amizade, ternura, entusiasmo pela beleza e o encontro de almas” (PRIORE, 2008, pag. 11). Eram como a própria autora os define, “almas gêmeas”.
Contudo, onde ficaria nessa história de amores proibidos a mulher do Imperador? É lógico que Mary Del Priore, que durante toda a obra não se cansa de elogiar sua biografada, não ia deixar de diminuir D. Teresa Cristina, em detrimento da amante do marido desta. Quer a autora fazer a soberana passar por uma pobre coitada, limitada intelectualmente, e cujo único talento era a música e a religião. No entanto, sabemos (e para isso não faltam fontes) que a Imperatriz era uma mulher que amava o estudo e as artes, além de gostar de arqueologia e fotografia. Uma das fontes que Priore se utiliza para falar de D. Teresa consiste na série de dez diários pessoais da mesma. Entretanto, a autora extrai de tais documentos apenas passagens que demonstram uma “suposta” inveja que a soberana mantinha pela amante do marido, desconsiderando, nesse caso, outras informações de sua vida cotidiana que, por sua vez, se expostas inocentá-la-iam da acusação de pessoa triste e silenciosa.

Condessa de Barral – Mary Del Priore
Entre os membros da nobreza, escolher com quem queria se casar era um privilégio de poucos: a rainha Vitória escolheu para si o príncipe Albert e os dois tiveram um relacionamento muito feliz; Luísa Margarida Portugal e Barros, que não era uma rainha, mas tinha o gênio de uma, escolheu para si Eugênio de Barral como marido; D. Pedro II, porém, casou por conveniência, e apesar de inicialmente não amar a sua esposa, aprendeu a aceitá-la e respeitá-la com o passar dos anos, visto que ambos mantinham uma série de interesses em comum. Isso, entretanto, não impediu que ele procurasse o amor nos braços de outra (ou outras), embora com mais discrição do que outrora fizera seu pai. Nesse aspecto, uma obra como “Condessa de Barral” exerce um grande fascínio na mente do leitor, não pela sua apologia ao sexo, mas sim por apresentar personagens antes vistos como deuses, despidos de sua manta de imunidade e expostos como seres humanos, capazes de amar e sofrer assim como o mais simples dos mortais.
Renato Drummond Tapioca Neto
Graduando em História – UESC
Esse é o segundo livro que leio, da lavra da Del Priore. Apaixonante !!! Estávamos realmente precisando de uma escritora com toda essa carga de cultura para levantar o véu sobre nosso passado nas figuras de proa, como a Princesa Isabel, o Conde d”Eu e a fabulosa Luíza, Condessa de Barral !!!
CurtirCurtir
A condessa estava ‘a frente do seu tempo’ porque o pai dela permitia isso, talvez por ela ser a única filha dele. A autora faz questão de idolatrar a condessa e diminuir a imperatriz. Eu não concordo, ela quer transformar a condessa na versão melhorada da Domitila. Não há muitas provas do relacionamento cheio de paixão, carnal e fogoso do imperador com a condessa e percebe-se q a autora queria muito que fosse verdade. Acho q ela idealiza muito este suposto caso amoroso de D. Pedro II com a condessa.
CurtirCurtir
Se existe uma pesquisa sobre esses fatos históricos, seria uma falha irresponsável, da escritora .Pelo currículo que ela tem eu a considero e respeito os seus relatos.
Ninguém mencionou,mas Tereza Cristina era feia e manca,D.Pedro um belo homem. Ele foi enganado. Ai, aparece Barral,esbanjando sensualidade e cultura. Porque não se amarem?
CurtirCurtir