Por: Renato Drummond Tapioca Neto
Em fevereiro de 2013, o Brasil pôde apreciar os resultados obtidos pela equipe de pesquisadores liderados pela arqueóloga e historiadora Valdirene do Carmo Ambiel, com os remanescentes humanos da primeira família imperial brasileira, sepultada na cripta dentro do Monumento ao Centenário da Independência (São Paulo – Sp). Por meio dos dados coletados, foi possível desconstruir muitos boatos envolvendo tais personagens de nossa história que ali descansam, como o fato de que a Imperatriz Leopoldina teria fraturado o fêmur após ser empurrada escada abaixo pelo seu marido, D. Pedro I, no palácio de São Cristóvão. Não obstante, para surpresa dos cientistas, verificou-se que a Imperatriz D. Amélia, segunda esposa de Pedro I, havia sido embalsamada, tendo sua pele, cabelos, unhas e mesmo os cílios bastante preservados.
Dado ao grande sucesso do trabalho dos pesquisadores, que envolveu profissionais de várias áreas, foi possível recontar a história do Brasil através de uma nova perspectiva, mais verossímil e menos fantasiosa. Agora, um processo de pesquisa semelhante ao executado com D. Pedro I e suas duas esposas está em fase de discussão, mas desta vez envolvendo os segundo Imperador do Brasil, sua esposa, D. Teresa Cristina, sua filha, princesa Isabel, e o marido desta, Gastão de Orleans, conde D’Eu. Os corpos da família imperial do segundo reinado, por sua vez, encontram-se sepultados na catedral São Pedro de Alcântara, localizada em Petrópolis, Rio de Janeiro.

Túmulos de D. Pedro II e D. Teresa Cristina (ao centro), Princesa Isabel (esquerda) e do Conde d’Eu (direita), na Catedral São Pedro de Alcântara.
Expulsa do Brasil um dia após a proclamação da república (15 de Novembro de 1889), a família imperial passou a residir em Paris, sobrevivendo, em grande parte, da ajuda de amigos, como a Condessa de Barral. Após a morte de D. Pedro II, em 5 de Dezembro de 1891 (aos 66 anos), sua filha Isabel passou a residir com o marido e os três filhos no castelo D’Eu, na França, onde faleceria em 14 de Novembro de 1921, aos 75 anos de idade. Nesse mesmo ano, os restos mortais de Pedro II e Tereza Cristina eram transladados do panteão dos Bragança, em Portugal, para o Brasil a tempo das comemorações pelo centenário da independência, em 1922. Os corpos da Princesa Isabel e de seu marido, entretanto, só seriam transportados para cá em 1971, e depositados juntamente com os do imperador e o da Imperatriz.
De lá pra cá, a Catedral São Pedro de Alcântara e a cripta imperial têm sido um importante ponto de turismo para todos aqueles que desejam prestar homenagens a Pedro II e à sua família. Segundo José Murilo de Carvalho (2007, p. 222-223),
… Em quase meio século de reinado, D. Pedro II presidiu a solução dos grandes problemas que, quando ele subiu ao trono, ameaçavam a própria existência do país. À beira da fragmentação em 1840, o Brasil em 89 exibia poucos sinais de fratura. O tráfico fora extinto, e a escravidão fora abolida. […] A instabilidade política havia sido substituída pela consolidação do sistema representativo e pela hegemonia do governo civil, em nítido contraste como o que se passava nos países vizinhos. Na política externa, o Brasil definira com clareza e preservara seus interesses na região platina, e ganhara a respeitabilidade diante da Europa e dos países americanos…
Com isso, D. Pedro II consolidava sua imagem como monarca e garantia o respeito internacional tanto pela dignidade quanto pela forma patriótica com que exercia o poder, além de seu patronato à ciência e às artes (ibidem).

D. Pedro II em seu leito de morte
Em sua última fotografia, tirada quando já estava morto por Paul Nadar, podemos observar o soberano já bastante envelhecido, apesar de seus 66 anos. No final, tantas lutas, vitórias e decepções acabaram por cobrar seu preço ao homem que enxergava a pompa da realeza como um fardo e que certa vez disse: “Se os brasileiros não me quiserem por imperador, serei professor”. Quantas estórias e quantos mistérios envolvem a figura do segundo imperador constitucional do Brasil. Muitas das perguntas, por sua vez, poderão ser esclarecidas a partir da análise de seus remanescentes humanos. Contudo, para que o projeto de pesquisa tenha continuidade, ainda é preciso alguns trâmites legais, como a autorização dos atuais descendentes da família imperial, tanto do ramo de Petrópolis, quanto do ramo de Vassouras.
Segundo a arqueóloga e historiadora Valdirene, em entrevista publicada na edição desta quarta-feira pela revista digital “O Globo Mais” (leia mais aqui), “Lidar com remanescentes humanos ainda é um tabu, e não é só no Brasil. […] Eu os vejo como seres humanos, não como simples objetos de estudo. Eles tiveram a vida deles, assim como eu tenho a minha. Isso deve ser respeitado independentemente de ser um imperador. Além do respeito, trabalhamos para o conhecimento e queremos fazer isso para a nossa sociedade atual. Não é aquela coisa de olhar o passado como uma coisa arcaica, mas sim como aprendizado”.
Fontes:
Bibliografia consultada:
CARVALHO, José Murilo de. D. Pedro II – São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
AMBIEL, Valdirene Do Carmo. Estudos de Arqueologia Forense Aplicados aos Remanescentes Humanos dos Primeiros Imperadores do Brasil Depositados no Monumento à Independência. 2013. 235 f. Dissertação (Mestrado em Arqueologia) – MAE, Universidade de São Paulo, São Paulo. 2013.
Texto escrito para o Causas Perdidas.