Mulheres, guerreiras, rainhas: como as seis esposas de Henrique VIII moldaram a história inglesa!

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Em 28 de junho de 1491, a rainha Isabel de York dava à luz no Palácio de Placentia sua terceira criança nascida do casamento com o rei Henrique VII da Inglaterra. Batizado com o mesmo nome do pai, o menino recebeu, entre muitos títulos, o de duque de York (geralmente reservado para o segundo herdeiro na linha de sucessão ao trono). Com a morte prematura de seu irmão mais velho, Arthur, em 1502, ele se tornou também duque da Cornualha e príncipe de Gales, recebendo então uma educação que o preparasse corretamente para se tornar o próximo soberano. Em 1509, após o falecimento de seu pai, o jovem se tornou o oitavo Henrique a ocupar o trono inglês. Muitas expectativas foram depositadas naquele novo monarca, que carregava consigo uma promessa de renovação para um país arrasado pela guerra civil, ocorrida poucas décadas antes. Para selar então esse destino, ele tomou por esposa a bela viúva de seu irmão, a princesa espanhola Catarina de Aragão, tão amada e querida pelo povo quanto o próprio soberano. Tudo indicava que um horizonte dourado cobriria para sempre o reino da Inglaterra, sem qualquer sinal aparente das nuvens carregadas que iriam manchar de cinza a vida do rei e de seus súditos no futuro.

Catarina de Aragão, por Michael Sittow (c. 1503).

O início desse texto, embora romantizado pelo autor que vos escreve, nos induz à conclusão precipitada de que ele se trata de mais uma matéria sobe Henrique VIII, famoso por ter rompido com a Igreja Católica, tornando-se o Chefe Supremo de uma religião reformada, a Igreja Anglicana, e por ter se casado seis vezes em busca de um herdeiro que o sucedesse ao trono. Porém, os parágrafos que se seguem não têm como protagonista o rei Henrique, e sim as mulheres que ele tomou como consortes e o seu legado para a história da Inglaterra. A despeito do versinho que nos ajuda a decorar a ordem de sucessão das esposas do soberano – “Divorciada, decapitada, morreu. Divorciada, decapitada, sobreviveu” –, Catarina de Aragão, Ana Bolena, Jane Seymour, Ana de Cleves, Catarina Howard e Catarina Parr possuíam personalidades muito distintas e até hoje são alvo de mitificação e mistificação, tal como a figura do próprio rei, que ficou conhecido por estereótipos tão controversos quanto seu caráter. Para uns, era Henrique, o Grande; para outros, era o rei Barba Azul, que se livrava de suas consortes através dos meios mais sórdidos possíveis. A história, porém, celebrizou o culto às seis esposas de Henrique VIII, transformando-as em alvo de maior simpatia do que seu marido.

Começando por Catarina de Aragão, com quem o rei foi casado por 24 anos até  1533, quando o Arcebispo Thomas Carnmer dissolveu seu matrimônio (embora o Papa tenha emitido um veredito contrário), ela provou em solo inglês que era a autêntica filha de Isabel I de Castela, a poderosa rainha amazona que unificou o território espanhol. Na qualidade de rainha consorte, Catarina gozou por um longo período da confiança de Henrique, chegando a ser regente em nome do marido no ano de 1513, enquanto ele estava no continente em campanha militar contra os franceses. Aproveitando-se da ausência do monarca, os escoceses, liderados por seu rei, James IV (cunhado de Henrique VIII), cruzaram a fronteira e invadiram a Inglaterra. Embora a rainha Catarina estivesse grávida na ocasião, isso não impediu que ela vestisse armadura, montasse um cavalo e passasse as tropas em revista antes da batalha de Flodden Field, ocorrida em 9 de setembro. Os ingleses não só venceram o conflito, como a soberana enviou para seu marido na França o casaco ensanguentado de James IV, que morreu em combate. Essa vitória granjeou para Catarina o carinho indiviso dos súditos, que se lembravam dela desde tempos menos auspiciosos, quando a então princesa-viúva e seu séquito passavam por necessidades, à espreita de um futuro incerto na Inglaterra.

Embora Catarina fosse admirada por sua coragem, religiosidade e caridade, ela não conseguiu gerar uma criança do sexo masculino que sobrevivesse às primeiras semanas de nascimento. Sua única filha com o rei foi a princesa Mary, que se tornaria a primeira rainha reinante da Inglaterra. Nascida em 1516, a presuntiva herdeira da coroa recebeu toda a atenção da mãe. Uma das facetas talvez mais ignoradas da rainha Catarina de Aragão era o seu amor pela cultura renascentista e pela erudição. No início da década de 1520, ciente de que não conseguiria mais gerar filhos para a Coroa, ela intensificou seus cuidados para com a educação da princesa Mary, na intenção de prepará-la para o exercício do poder. Da mesma forma como sua mãe Isabel I de Castela havia feito consigo, a esposa de Henrique VIII escolheu a dedo os tutores da princesa, ensinando-lhe ela própria as primeiras lições de latim e depois requisitando de seus professores os exercícios da pequena pupila corrigidos, “porque será uma grande satisfação vê-la manter o seu latim e sua bela caligrafia, e tudo o mais”. Pouco depois, a soberana encomendou de seu conterrâneo, o humanista Juan Luís Vives, o que pode ser considerado o primeiro tratado sobre a educação feminina do período moderno.

Ana Bolena, por artista desconhecido (final do séc. XVI, com base em um original perdido de 1533).

Apesar de “The Instrucuion of a Christian Woman” fazer eco à crença partilhada no período de que as mulheres eram inferiores aos homens, o manual enfatizava a necessidade de se instruir o público feminino para que elas fossem capazes de assumir com maior capacidade suas responsabilidades, tais como o cuidado da casa, das finanças e das crianças. Vives dedicou sua obra à rainha Catarina de Aragão, a quem ele considerava um modelo de mãe. Amiga do humanista Erasmo de Roterdã, Catarina encomendou a ele em 1524 um trabalho sobre o casamento, como parte de seu interesse intelectual pela natureza do matrimônio e para preparar a princesa Mary para uma união dinástica com algum príncipe estrangeiro. Sua maturidade chegaria por volta dos 12 anos em 1528. Por um tempo, cogitou-se a possibilidade de que ela fosse desposada pelo primo, o imperador Carlos V. Infelizmente, os acontecimentos tomaram outro curso na década de 1520, com o processo de anulação do casamento real levado à cabo por Henrique VIII. Já em 1527, o rei havia deixado claro sua crença de que o Papa Júlio II não tinha autorização para emitir uma bula autorizado sua união com a viúva de seu falecido irmão, algo que ia contra o Livro de Levítico, capítulo 20, versículo 21: “Se um homem tomar por mulher a esposa do seu irmão, comete impureza; desonrou seu irmão. Ficarão sem filhos”.

Com efeito, Henrique relacionou a palavra “filhos” apenas a descendentes do sexo masculino. Assim, ele julgou que seu casamento estava amaldiçoado diante dos olhos de Deus e do mundo e buscou a sua anulação. O processo, porém, se arrastaria por sete longos anos, até que ele tomasse a resolução da questão em suas próprias mãos, desposando em seguida Ana Bolena, que outrora havia servido como dama de companhia de sua primeira esposa. A crença popular até hoje tem sido muito cruel para com a mãe da rainha Elizabeth I. No dia 19 de maio de 1536, ela foi decapitada por acusações de traição, adultério e incesto. Embora a pesquisa com as fontes tenha comprovado que havia uma disputa de partidos rivais na corte henriquina por trás da morte da rainha e que era quase impossível ela ter cometido adultério nas datas mencionadas no processo, ainda hoje lemos frases como “ela colheu o que plantou”, “ela mereceu morrer” ou “ela não prestava”. Em termos práticos, Ana Bolena foi executada por supostamente atentar contra a virilidade do soberano, colocando em risco a legitimidade dos herdeiros do trono. Por séculos, os chamados crimes passionais foram tolerados pela legislação inglesa como um direito masculino. Não raro, esposas adúlteras eram leiloadas como servas no mercado londrino.

Sendo assim, Ana Bolena foi mais uma entre tantas outras mulheres vítimas do patriarcado. Nesse rol, podemos encontrar personalidades famosas, como Dona Inês de Castro, Catarina Howard, Joana I de Castela, Joana d’Arc, entre tantas outras. Os dispositivos de poder que condenaram Ana Bolena foram os mesmos que afastaram Catarina de Aragão da corte, anularam o casamento de Ana de Cleves e executaram Catarina Howard (que tinha menos de 20 anos quando entregou seu pescoço ao machado do carrasco). Essas engrenagens políticas não eram coordenadas por mulheres e sim por homens. Em termos atuais (e peço perdão aqui pelo anacronismo) Ana Bolena se enquadraria como vítima de feminicídio. Além disso, insistir na velha disputa de mulheres (Catarina x Ana; Leopoldina x marquesa de Santos; Lady Di x Camila) é o mesmo que inocentar a parte que mais se beneficia dessa querela: os homens envolvidos em cada caso. Não é necessário diminuir uma mulher para exaltar outra. Cada uma dessas personagens possuía defeitos e qualidades. Afinal, eram seres humanos. Porém, sempre que frases como as destacadas no parágrafo anterior são escritas, percebe-se o quão pouco nossa percepção sobre o papel feminino na história evoluiu. Diante disso, me pergunto: quantas Anas Bolenas ainda vão morrer até que a venda do preconceito caia dos nossos olhos?

Jane Seymour, por Hans Holbein, o Jovem.

Muito além do estereótipo da esposa adúltera e ladra de maridos, Ana Bolena, assim como Catarina Parr, foi amiga de humanistas e reformistas, dando proteção a protestantes perseguidos pela Igreja Católica e patrocinando a primeira tradução da Bíblia para o vernáculo. A partir de então, todas as pessoas que não sabiam o latim teriam acesso às Sagradas Escrituras. Embora seja geralmente descrita como uma mulher de temperamento indômito, Ana está longe de ser o monstro sedutor com que até hoje muitos pintam sua imagem. Dez dias depois que seu corpo fora depositado em um túmulo na Capela de St. Peter Ad Vincula, na Torre de Londres, Henrique VIII contraía terceiras núpcias com Jane Seymour de Wolf Hall. Assim como Ana, Jane também servira no séquito de Catarina de Aragão e era muito simpática à causa da princesa Mary, exilada da corte e privada do título de princesa desde o nascimento de sua meia-irmã, Elizabeth. Geralmente recai sobre a rainha Jane o crédito por reconciliar pai e filha. Onde antes havia uma família real despedaçada, a nova consorte juntou os destroços encontrados pelo caminho e trouxe um pouco de tranquilidade para a corte, pelo menos no período de um ano e meio em que ela foi rainha.

As circunstâncias da morte de Jane Seymour em 1537, assim como as de Catarina Parr em 1549, dizem muito sobre a precariedade do tratamento médico concedido às mulheres gestantes no período. A própria mãe do rei, Isabel de York, também havia falecido de febre puerperal, pouco depois de dar à luz no dia 11 de fevereiro de 1503. Agora a história se repetia com Jane. Henrique VIII providenciou para ela um funeral magnífico, como nunca se vira em Londres desde a morte de sua mãe. Por um período de dois anos, ele viveu um luto intenso. Seu único consolo era o filho varão que Jane dera à Coroa, o futuro rei Edward VI. Finalmente, Henrique tinha um sucessor do sexo masculino. Mas, para que a perpetuidade da dinastia Tudor fosse assegurada, era preciso um suplente e nesse caso seria necessário contrair um quarto casamento. Dessa vez, o rei ordenou ao seu secretário, Thomas Cronwell, que procurasse no continente uma princesa estrangeira, cuja aliança trouxesse benefícios políticos para a Inglaterra. Infelizmente para os planos de Henrique, sua reputação naquela época era nada boa. Várias princesas, como Marie de Guise e Cristina de Milão, declinaram na oferta do rei. Considerava-se que o monarca era o verdadeiro responsável por trás das mortes de suas outras três consortes.

Finalmente, Cronwell encontrou para seu suserano uma aliança com o ducado de Cleves, um pequeno território que ficava na fronteira entre o Sacro-Império e o reino da França. Para tanto, ele enviou o pintor da corte, Hans Holbein, o Jovem, para produzir um retrato das filhas do duque que estavam aptas ao casamento. Até hoje, a tela que reproduz a imagem de Ana de Cleves gera bastante controversa, graças à falácia de que o artista havia lisonjeado demais a modelo com o uso de seus pincéis, na intenção de agradar o soberano e assegurar sua aprovação ao matrimônio. Consequentemente, a quarta esposa de Henrique VIII entrou para a história marcada por uma série de rótulos, tais como “feia”, “fétida” e, o pior deles, “égua de Flandres”, um termo que teria supostamente sido dito pelo próprio rei para se referir à consorte, embora nenhum registro contemporâneo dessa frase tenha sobrevivido. O mais correto seria afirmar que as incompatibilidades culturais e linguísticas entre o soberano e sua esposa levaram ao rompimento do casamento, seis meses depois que Ana chegou à Inglaterra, em 1540. Caso ela não concordasse com a anulação do matrimônio, sua vida estaria à mercê da vontade do monarca, cujo temperamento piorara muito nos últimos anos.

Retrato de Ana De Cleves executado por Hans Holbein. Segundo fontes, Henrique considerou a pintura por demais lisonjeira.

Temendo o mesmo destino de suas antecessoras, Ana de Cleves resolveu aquiescer. Em deferência, Henrique lhe concedeu uma pensão, terras e propriedades, incluindo o castelo de Hever (antigo lar da família Bolena) e o direito de ser chamada de “irmã do rei”, estando abaixo apenas da rainha e de Lady Mary e Lady Elizabeth na hierarquia de mulheres da corte. No final, Ana sobreviveria ao próprio monarca, bem como às suas duas últimas esposas, Catarina Howard e Catarina Parr. Ela ainda presenciou a ascensão de dois dos herdeiros do soberano ao trono, Edward VI e Mary I. Assim sendo, a princesa de um modesto ducado nos estados germânicos se tornou uma mulher economicamente emancipada, dentro de uma sociedade fortemente marcada pelo patriarcalismo. Infelizmente, sua sucessora no posto de consorte real não teve a mesma sina. Catarina Howard era pouco mais do que uma adolescente quando foi introduzida no séquito de damas de Ana de Cleves, sendo em seguida usada por seu tio, o duque de Norfolk, para capturar a atenção do soberano e suplantar sua senhora como rainha. Ela não compreendia como a corte real era um universo perigoso para jovens inexperientes, onde cada palavra podia ser mal interpretada e levar seu autor ou autora direto ao machado do carrasco.

Mais uma vez correndo o risco de ser anacrônico, Catarina Howard poderia ser facilmente classificada em termos modernos como vítima de abuso infantil. Prima de Ana Bolena, ela possivelmente tinha 17 anos quando se casou com o rei. Na época do casamento, o monarca tinha 49 anos! A historiografia inglesa dispõe de poucos detalhes sobre sua vida, pois a maioria dos dados foram retirados do processo movido contra ela em 1541, por traição e adultério. De acordo com tais documentos, a jovem crescera na casa de sua avó, a duquesa-viúva de Norfolk, ao lado de outras garotas num clima de pouco rigor educacional. Possuímos poucos registros de próprio punho da rainha, de modo que não se pode fazer um julgamento mais preciso acerca de suas faculdades mentais. Com seu casamento, o clã dos Norfolk ganhou novamente muito poder e prestígio. Mas, como a principal função de uma rainha consorte era gerar herdeiros para a Coroa e como os sinais de uma possível gravidez não se manifestaram no corpo da jovem Catarina, ela teria sido enredada numa conspiração arquitetada por Jane Rochford para conceber um herdeiro fora do casamento. Rumores de que a rainha mantinha um caso com o pajem do rei, Thomas Culpeper, chegaram aos ouvidos de Henrique, alimentados por facções rivais da família Howard, como os Seymour.

Em última análise, Catarina fora empurrada para o olho do furacão sem qualquer preparo para seu papel como soberana e sem o auxílio de pessoas mais sábias que pudessem orientá-la.  Acabou sendo uma vítima das disputas pelo poder entre as famílias nobres da corte. Quando um inquérito fora instaurado, outro nome masculino surgiu no processo, Francis Dereham, com quem Catarina mantivera alguma afinidade durante os tempos em que viveu na casa da duquesa-viúva de Nolfolk. Julgada culpada, ao lado de Culpeper e Dereham, ela foi decapitada na Torre de Londres em 13 de fevereiro de 1542, dezoito meses após se tornar rainha da Inglaterra. Atualmente, seu corpo jaz lado-a-lado com o de sua prima, Ana Bolena, na Capela de St. Peter Ad Vincula. Porém, a carreira marital de Henrique VIII não se encerrou por aí. Em 12 de julho de 1543, ele se casou pela sexta e última vez com Catarina Parr. Viúva de dois maridos, ela tinha 31 anos quando se tornou rainha consorte. Henrique, por sua vez, tinha 52. Nascida em 1512, Catarina era filha de Thomas Parr e Maud Green, que foi dama no séquito de Catarina de Aragão. Possivelmente, a filha do casal foi batizada em homenagem à primeira esposa do soberano e, tal como a filha de Isabel I de Castela, Catarina Parr atuou como regente enquanto seu marido estava em campanha militar na França, no ano de 1544-45.

Provável retrato de Catarina Howard, prima de Ana Bolena também decapitada por adultério em princípios de 1542 (pintado por Hans Holbein).

Com efeito, os quase quatro anos em que a sexta esposa de Henrique VIII assumiu o papel de rainha consorte foram de fundamental importância para os eventos transcorridos após a morte do soberano. Ela foi muito mais do que uma mera cuidadora de um monarca doente e mãe postiça para seus filhos órfãos. Catarina foi a primeira rainha da Inglaterra a registrar uma obra em seu nome, o que de longe a torna uma das mulheres mais interessantes do período. Em 1544, ela publicou de forma anônima a obra “Salmos e Orações”. Já no ano seguinte, ela assinou o livro “Orações e Meditações”. Porém, seu título de maior sucesso, que ganhou várias edições, foi “Lamentações de um pecador”, lançado em 1547. Entretanto, existem pouquíssimos registros contemporâneos detalhando suas características físicas. Ao que tudo indica, ela era loira, alta para seu tempo e de olhos claros. Conforme podemos observar em seus retratos, ela era uma mulher atraente o suficiente para cativar o rei. Foi graças à sua influência que Henrique VIII readmitiu as filhas de seus dois primeiros casamento, Lady Mary e Lady Elizabeth (mais tarde Mary I e Elizabeth I da Inglaterra) na linha sucessória ao trono. Após a morte do rei, Catarina se casou pela quarta vez com Thomas Seymour, irmão da falecida rainha Jane (ela morreu em 5 de setembro de 1548, de febre puerperal, contraída logo depois do nascimento de sua única filha com Thomas).

Nas primeiras horas da madrugada do dia 28 de janeiro de 1547, falecia aos 55 anos o rei Henrique VIII da Inglaterra, no Palácio de Whitehall, em Londres. Há anos, o monarca sofria com sérios problemas no trato digestivo, agravados pela obesidade, e por sua perna ulcerada, que lhe causava fortes dores e às vezes o impossibilitava de andar. À beira da morte, o soberano mal conseguia se comunicar. Segundo Antonia Fraser: “Nos seus últimos dias, só membros do Conselho Privado e os Cavalheiros da Casa Real tinham tido permissão para vê-lo. […] No entanto, quando o arcebispo pediu ao rei que lhe desse algum sinal, com os olhos ou com a mão, de que confiava em Deus, o rei conseguiu apertar a mão de Cranmer” (2010, p. 521). Nem a rainha Catarina Parr ou as filhas do monarca, Lady Mary e Lady Elizabeth, se encontravam presentes na ocasião. Elas partiram para o Palácio e Greenwich na véspera do Natal de 1546 e nunca mais voltariam a ver o soberano com vida. Conforme dito anteriormente, Catarina Parr acabou se tornando a última das seis esposas de Henrique VIII, usufruindo do título de rainha-viúva, das joias, rendas e propriedades que lhe haviam sido garantidas pelo casamento real, como o castelo de Sudeley, onde ela veio a falecer.

Imediatamente após a morte do rei, a família Seymour tratou de tomar as rédeas dos assuntos de Estado, com Sir Edward Seymour agindo como regente em nome do sobrinho. De acordo com o último Ato de Sucessão aprovado pelo Parlamento durante o reinado de Henrique VIII, a coroa passaria para seu único filho varão, o príncipe Edward VI. Na ausência de filhos do novo rei, o trono seria então herdado pela filha mais velha de Henrique, Lady Mary. Depois dela, vinha sua meia-irmã, Lady Elizabeth. As duas princesas, que foram readmitidas pelo soberano como sua sucessoras legítimas, chegaram a governar após a morte precoce do irmão, em 1553. Essa talvez seja uma das maiores ironias na história de Henrique VIII. Depois de tantas disputas políticas e religiosas, que custaram as vidas de mais de 72 mil pessoas para que os ingleses fossem governados por um sucessor masculino, foram as duas filhas do monarca que provaram aos seus contemporâneos o quão preparadas eram para o exercício do poder. Mary e Elizabeth, filhas de Catarina de Aragão e Ana Bolena, respectivamente, abriram as portas para que outras mulheres depois delas pudessem herdar a coroa em direito próprio. Isso resultou em alguns dos reinados mais gloriosos que a história britânica já viu, como o de Vitória no século XIX e o da atual rainha Elizabeth II.

Referências Bibliográficas:

Catarina Parr, por artista desconhecido (final do século XVI).

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NORTON, Elizabeth. The Anne Boleyn Papers. UK: Amberley, 2013.

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