Uma das primeiras influenciadoras da história: Eugénia de Montijo, imperatriz dos Franceses!

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Hoje em dia, redes sociais como o Instagram, Tik Tok, Telegram, entre outras, estão repletas de perfis que oferecem produtos de marcas famosas, sejam elas de roupas, cosméticos ou de comida. A dinâmica de tais plataformas permite que qualquer indivíduo possa se tornar um “digital influencer”. Não precisa ser famoso, artista de cinema ou estrela da música. Muitas pessoas conseguem sair do anonimato graças à produção de conteúdo para um determinado público, conquistado assim centenas de milhares de seguidores. Mas, seria esse fenômeno tão atual quanto imaginamos? Voltemos ao passado, para uma época em que jornais e revistas circulavam com bastante frequência, as mensagens podiam demorar dias (ou meses) para chegar ao seu destino e a fotografia não era tão acessível quanto nos permitem os aparelhos de celulares modernos. No século XIX, soberanas como Elisabeth da Áustria, a princesa Alexandra de Gales ou a imperatriz Eugénia de Montijo despontavam na vanguarda das tendências do período, ditando os parâmetros da moda feminina e promovendo o uso de determinadas peças entres as demais mulheres da aristocracia e da burguesia em ascensão. Graças à imprensa da época, elas se tornaram o que podemos chamar de primeiras influenciadoras da história, especialmente a esposa de Napoleão III.

A jovem Eugénia de Montijo aos 23 anos, quando atendia pelo título de condessa de Teba. Tela de Federico Madrazo y Kuntz, 1849 (Palacio de Liria, Madrid, Espanha).

Nascida em Granada, na Espanha, no dia 5 de maio de 1826, Eugénia veio ao mundo de forma prematura, pois, segundo se conta, um terremoto local precipitou as contrações de sua mãe, Maria Manuela Kirkpatrick, que ainda não havia passado pelos 9 meses de gestação. Seu pai, Cipriano de Portocarrero, 8º Conde de Montijo, havia se tornado um dos homens mais proeminentes da Espanha, providenciado para Eugénia e sua irmã, Paca, uma educação superior à de outras jovens da aristocracia. Um escândalo amoroso envolvendo o nome do conde, porém, fez com que sua esposa abandonasse o teto do marido com as duas filhas e partisse para a França. Ali, Eugénia começou a frequentar os círculos da alta sociedade, adquirindo os modos coquetes de uma dama parisiense. Tornou-se versada na arte da conversação e uma mulher bastante atraente, não apenas por sua notável beleza, mas principalmente por sua inteligência e naturalidade. Seus modos despertaram o interesse do imperador Napoleão III (sobrinho do lendário general), que havia dado um golpe de estado e reinstalado a monarquia da França. Em 30 de janeiro de 1853, ele desposou a bela Eugénia de Montijo, fazendo da jovem imperatriz dos Franceses. Nem todos os círculos da nobreza europeia, por outro lado, viram o casal com bons olhos.

Com efeito, a rainha Vitória foi uma das primeiras chefes de Estado a dar as boas-vindas ao imperador e à imperatriz no Castelo de Windsor, em 1855. Naquela ocasião, ela teve a oportunidade de ver de perto o fascínio que a soberana exercia diante dos seus espectadores. Dizem que até mesmo o príncipe Albert ficara embevecido pelos modos e pelo charme da consorte de Napoleão III. Mais interessante ainda foi o baile oferecido no Castelo em homenagem ao casal imperial: várias damas inglesas, inclusive a rainha, surgiram com ramos de flores pregueados nos seus vestidos, apenas porque viram Eugénia fazer o mesmo um dia antes. O que elas não sabiam, contudo, é que a bagagem da imperatriz se atrasara. Então, ela teve que improvisar: usou seu vestido pelo lado avesso e salpicou a saia com ramos que ela havia encontrado em um dos jarros do seu quarto. Isso revela bastante sobre o poder de Eugénia como influenciadora em meados do século XIX. Com o passar do tempo, sua celebridade aumentaria de forma exponencial, estando intrinsecamente ligada a um dos maiores nomes da moda na época: Charles Frederick Worth, fundador da Casa Worth!

Detalhe da tela pintada por Franz Xaver Winterhalter, de Eugénia de Montijo em trajes de corte no ano de 1862 (Palácio de Liria, Madrid, Espanha).

Já no século XVIII começaram a surgir as primeira revistas de moda, que circulavam entre a nobreza e a realeza europeia. Em tais periódicos, o estilo de mulheres elegantes como Maria Antonieta da França e Georgiana, duquesa de Devonshire, era amplamente consumido. Mas, apenas 100 anos depois esse costume se tornaria mais arraigado, atingindo também a classe média e alguns extratos mais baixos da sociedade. Uma mulher bem vestida era sinônimo da riqueza e da prosperidade de seu marido. Quanto mais joias e tecidos caros ela usasse, melhor estava representado o status econômico do cônjuge. Eugénia de Montijo merece o crédito como uma das primeiras influenciadoras da história, não apenas por ditar tendências, mas principalmente por estar intimamente associada à grife fundada por Charles Frederick Worth, considerado o pai da alta costura. Nascido na Inglaterra, ele foi o primeiro estilista a criar na França coleções de primavera-verão, outono-inverno. Além disso, ele utilizava sua própria esposa, Marie Vernet, como manequim para sua criações, criando assim a primeira modelo de prova de que temos conhecimento. Logo, ele atraiu uma clientela muito sofisticada, que incluía a imperatriz dos franceses.

Eugénia “começou a vivenciar a moda quando a moda começou a existir como tal”, explica Ely Martínez, especialista de Moda, Arte e História. A imperatriz teria ficado encantada com os croquis do estilista, que lhes foram enviados por sua amiga, Pauline de Matternich, esposa do embaixador austríaco na França. Deslumbrada pelo talento de Charles Worth, a soberana quis fazer contato com o designer. Décadas antes, era comum que as modistas (a exemplo de Rose Bertin, responsável pela maioria do guarda-roupas de Maria Antonieta), visitassem as casas de suas clientes e produzissem peças de acordo com os seus desejos. Com o fundador da Casa Worth era diferente. Dentro de seu próprio ateliê, era ele quem recebia as compradoras em sua loja e não o contrário. Uma vez lá, elas decidiam o que queriam adquirir, de acordo com o que o designer definia como tendência. Eugénia logo se converteu na maior cliente da marca. Segundo Lorenzo Caprille e Eloy Martínez de la Pera; “Estamos acostumados a falar da bolsa Kelly, da bolsa Birkin e da Lady Dior, mas naqueles anos Eugénia tinha suas próprias prendas, como o ‘chapeuzinho Eugénia’ e o ‘paletó Eugénia’, um casaco bem largo com mangas bem bufantes para poder usar com aqueles vestidos da época”.

Eugénia de Montijo atraiu um círculo de seguidoras que adoravam copiar o que ela vestia. Aqui, vemos a imperatriz dos Franceses cercada por suas damas de companhia. Tela de Franz Xaver Winterhalter, 1855 (Musée du Second Empire, Compiègne)

A exemplo dos ícones femininos do século XX, como Grace Kelly, Audrey Hepburn, Marilyn Monroe, Madonna e a princesa Diana, Eugénia de Montijo atraiu um círculo de seguidoras que adoravam copiar o que ela vestia. Entre elas se encontravam a rainha Vitória e sua filha mais velha, Vicky, princesa real, incluindo também a primeira-dama dos Estados Unidos, Mary Ann Todd Lincoln, que fazia replicas com sua costureira privada dos modelos usados pela imperatriz consorte dos Franceses. Por outro lado, se os seguidores, como vimos, já não eram novidade desde o século XIX, tampouco eram os detestados “haters”. Pois é! Eugénia também os tinha, a exemplo de sua própria cunhada, a princesa Matilde Bonaparte, uma vez que, até a chega da esposa de seu irmão na corte, em 1853, ela era vista como a primeira-dama da França. Infelizmente, poucas peças do magnífico guarda-roupas de Eugénia sobreviveram aos dias de hoje. Podemos admirar a sua elegância através dos magníficos retratos que Franz Xaver Winterhalter lhe pintou. A soberana era uma de suas principais musas e continuaria sendo até a morte do artista, em 1873, quando o império francês havia sido dissolvido depois da guerra Franco-Prussiana, na qual os franceses perderam a região da Alsácia e da Lorena para os alemães.

Eugénia faleceu em 11 de julho de 1920 no Palácio de Liria, em Madrid, onde moravam seus sobrinhos, os duques de Alba. Morreu a mulher e nasceu uma verdadeira lenda! É justamente no Palácio de Liria onde se encontra uma vasta coleção relativa à última imperatriz dos Franceses, desde retratos pintados, móveis e outros objetos de uso pessoal da soberana. Entre os quais, destaca-se um busto de Eugénia, usando uma belíssima tiara combinando com um par de brincos e um broche. Seu colo aparece em evidência devido ao generoso decote de seu vestido drapeado na região do seio. “Ela transformou um defeito físico, que eram aqueles ombros levemente caídos, em uma virtude ao focar a atenção naqueles decotes que deixam os ombros nus e que opticamente fazem eles parecerem mais largos”, declarou Lorenzo Caprile ao site Coser y Contar. Eugénia também apreciava o uso de mantilhas decoradas com renda, cuja tendência ela lançara em seu tempo de vida como uma espécie de xale. Outro adorno pelo qual ela era fascinada consistia no uso de leques, geralmente com cabo de marfim ou madrepérola e pintados à mão por verdadeiros artesãos. Seja em eventos oficiais ou no conforto de seus aposentos privados, ela nunca deixava de lado o tal adereço.

Fotografia de Eugénia de Montijo, tirada pouco antes de sua morte, em 1920.

Diante de tudo o que foi exposto até aqui, podemos concluir que Eugénia de Montijo foi uma das primeiras influenciadoras da história. Graças ao cuidado que ela tinha para com sua própria imagem, ao seu bom gosto e por sua associação com Charles Worth, ela serviu como inspiração para muitas mulheres de seu tempo, fossem elas da aristocracia, da burguesa ou da classe média. Na opinião de Lorenzo Caprile:

É sempre a mesma imagem, o mesmo tipo de penteado, com o cabelo preso, os colares de pérolas, aquele decote que a popularizou… e nesse sentido acho que ela estava à frente de uma técnica de marketing muito comum quando se tem que criar uma imagem de marca, ela sempre ofereceu a mesma imagem nos retratos oficiais para que você diga imediatamente, aquela é a Imperatriz Eugénia!

Eugénia passaria o resto de seus dias exilada na Inglaterra, a convite da rainha Vitória. Pouco depois, ela trocaria seus elegantes vestidos de cetim enfeitados com tule e renda pelos trajes de viúva, enlutada pela morte do marido e do único filho. Em seguida, ela passou a fazer peregrinações pelo continente, visitando Sissi na Áustria, seus parentes na Espanha e arriscando sua vida para conhecer o local onde seu filho, Napoleão Eugénio, fora assassinado por um grupo de zulus na África do Sul, em 1878. Sua maior alegria depois de tantas perdas foi ver a Alemanha finalmente derrotada na Primeira Guerra Mundial, antes de fechar seus olhos pela última vez, debaixo do céu de sua adorada Espanha.

Referências Bibliográficas:

ANDERSON, Theo. Queen Victoria and the Bonapartes. London: Cassel & Company LTD, 1972.

KENT, Princesa Michael de. Coroadas em terras distantes. Tradução de Maria João Batalha Reis. São Paulo: Ambientes e Costumes Editora, 2011.

MARATÓ, Cristina. Reinas Malditas: emperatriz Sissi, María Antonieta, Eugenia de Montijo, Alejandra Romanov y otras reinas marcadas por la tragedia. España: Debolsillo, 2014.

Tele Madrid. Así era una de las primeras influencer de la historia, Eugenia de Montijo. 2022 – Acesso em 25 de Janeiro de 2023.

Tele Madrid. Coser y Contar: Eugenia de Montijo. 2022 – Acesso em 25 de Janeiro de 2023.

2 comentários sobre “Uma das primeiras influenciadoras da história: Eugénia de Montijo, imperatriz dos Franceses!

  1. Muito bom esse post, não conhecia a história de Eugenia Montijo. Como sempre, você trouxe mais conhecimentos interessantes sobre figuras históricas para seus leitores. Obrigada!

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