Por: Renato Drummond Tapioca Neto
Em seu tempo de vida, Maria Antonieta foi dona de uma das maiores coleções de joias da Europa Talvez, apenas a imperatriz Joséphine de Beauharnais pudesse rivalizar com ela no tamanho e valor de suas pedras preciosas. Ao se casar com o delfim da França, em 1770, ela recebeu de sua mãe, a imperatriz Maria Teresa, um conjunto de diamantes brancos avaliados na época em 200 mil florins. Ao lado dessas pedras preciosas, a nova delfina herdou todas as joias oficiais de rainha da França, uma vez que não havia uma consorte real em Versalhes no ano de seu casamento com Luís Augusto (a rainha Maria Leszczyńska havia falecido em 1768). Com o passar do tempo, Maria Antonieta foi aumentando sua coleção. Em 1785, ela já considerava seus estojos suficientemente cheios. A monarca foi reunindo peças bastante raras, como um diamante rosa que teria passado para as mãos de sua filha, Maria Teresa, duquesa de Angoulême. Agora, o diamante reapareceu aos olhos públicos, em um leilão organizado pela Christie’s no dia 17 de junho de 2025,em Nova York.

Tela “Maria Antonieta com uma rosa”, por Mme. Vigeé-Le-Brun, 1783. Ao lado, o diamante rosa, em anel desenhado por JAR (foto: Christie’s).
Acredita-se que a joia de 10,38 quilates seja oriunda das legendárias minas de Golconda, na Índia, famosas por produzir gemas de pureza e brilho inigualáveis. Estima-se que, para cada 1 milhão de quilates de diamantes encontrados no mundo, apenas 1 quilate seja naturalmente rosa, o que torna essa pedra preciosa realmente única. Tanto, que Rahul Kadakia, chefe internacional de joias da Christie’s, descreveu-a como uma “maravilha natural”. Outras pedras famosas como essa teriam passado pelos porta-joias de Maria Antonieta, como o diamante azul da coroa francesa, mais conhecido hoje como diamante Hope. Após a Revolução Francesa, as joias oficiais de Estado, que estavam em posse da rainha, foram confiscadas pela Convenção Nacional. Apenas as joias de caráter pessoal ficaram consigo, como as gemas que ela recebera de sua mãe, em 1770. Durante a tentativa de fuga da família real, em 1791, Maria Antonieta e sua camareira, Madame Campan, embalaram antecipadamente os diamantes de sua coleção e enviaram secretamente para a Áustria.
Com efeito, a rainha acreditava que ela e sua família poderiam sobreviver do valor das joias, caso conseguissem deixar a França com segurança. Uma parte de sua coleção pessoal foi remetida com segurança para Bruxelas, onde a irmã da monarca, Maria Cristina, era a arquiduquesa regente. O invólucro precioso foi entregue ao cabelereiro Léonard, que deveria fazer com que seu conteúdo chegasse com segurança até o destino. Infelizmente, a fuga não deu certo e Maria Antonieta, Luís XVI e seus dois filhos foram reconhecidos e presos no vilarejo de Varennes, no dia 21 de junho de 1791. Dois anos depois, tanto o rei quanto a rainha seriam decapitados por alta traição, durante a fase do Terror revolucionário. Porém, o que aconteceu com os diamantes confiados a Léonard? As joias foram levadas até a Áustria, permanecendo entre as posses do imperador Francisco II, até que foram passadas para Maria Teresa Carlota, única filha sobrevivente do casal de monarcas.

Acredita-se que o diamante estivesse entre as joias da rainha, entregues ao cabeleireiro Léonard em 1791, antes da malfadada fuga de Varennes (foto: Christie’s).

Detalhe do retrato de Maria Teresa Carlota, pintado em 1816 por
Antoine-Jean Gros, no qual ela usa as pulseira de diamantes de sua mãe, entre outras joias da rainha.
No total, as joias no baú entregue a Léonard valiam aproximadamente 350.000 livres (algo em torno de 1,5 milhão de dólares). Entre elas, possivelmente se encontrava o diamante rosa, ligado à Maria Teresa. Embora seja difícil traçar o paradeiro da pedras preciosas da antiga coleção de Maria Antonieta, uma vez que muitas de suas joias foram desmembradas e usadas para a confecção de outras peças, o destino de algumas permaneceu bem documento. Esse é o caso do diamante rosa. Como a duquesa de Angoulême morreu sem filhos, em 1851, ela deixou as joias de sua mãe para seus sobrinhos: Louise Marie, duquesa de Parma e Piacenza e Henri, conde de Chambord. Algumas dessas joias, que estavam na coleção da família Bourbon-Parma, foram leiloadas pela Sotheby’s em 2018. Uma delas era um broche de laço de diamantes com uma enorme pérola em formato de gota, vendida pela impressionante soma de 44 milhões de dólares.
Em 2021, um par de pulseiras de diamantes da rainha foi leiloado pela Christie’s por 8,2 milhões de dólares. Qualquer objeto ligado à última rainha da França atrai a atenção de todo o mundo, o que atesta o poder e a influência de Maria Antonieta na moda, mais de 230 anos depois de sua morte na guilhotina. Com o diamante rosa, não deve ser diferente. De acordo com uma nota manuscrita que acompanha a gema preciosa, a pedra passou de Maria Teresa para a arquiduquesa Maria Teresa da Áustria-Este, esposa de Henri, conde de Chambord. Como o casal não produziu herdeiros, o diamante passou para as mãos de sua sobrinha, a rainha Maria Teresa da Baviera, conforme descrito no inventário da monarca: “um diamante solitário rosa da tia Chambord”. Embora a documentação trace o paradeiro da joia até a duquesa de Angoulême, de acordo com os historiadores, provavelmente pertenceu à sua mãe antes.

Grampo para cabelos, onde o diamante rosa estava engastado antes. Seu design foi pensado pelo joalheiro da corte austríaca (foto: Christie’s).

Par de pulseiras de diamantes adquiridas por Maria Antonieta em 1776, que foram leiloadas pela Christie’s em 2021. Objetos ligados à rainha possuem um valor bastante alto no mercado.
“Maria Antonieta possuía um olho extraordinário para a beleza e um profundo apreço por pedras preciosas excepcionais – valorizando-as não apenas por sua raridade e valor, mas por sua elegância e singularidade”, disse Rahul Kadakia. Falando sobre o diamante rosa de Maria Teresa, ele completou: “Esta linhagem real extraordinária e contínua – intimamente documentada e profundamente pessoal – torna o diamante não apenas uma maravilha natural, mas um testemunho vivo da história europeia”. A última vez em que o diamante havia aparecido no mercado de leilões foi em 1996, como parte de um grampo de ouro e prata para cabelos, guardado dentro de um estojo forrado com veludo roxo, estampado com o monograma imperial austríaco de A.E. Köchert, o estimado joalheiro da corte vienense, conhecido por ser o preferido da Imperatriz Elisabeth “Sissi”.
Para o leilão da Christie’s, o design do diamante foi reimaginado. Em vez de constar em um prendedor de cabelos, o diamante foi engastado em nova moldura: um anel desenhado pelo joalheiro americano Joel Arthur Rosenthal (mais conhecido por sua sigla JAR). A pedra preciosa aparece coroada por uma flor de Lis de diamantes brancos (o símbolo da monarquia francesa). O lance inicial era de 3 milhões de dólares, mas a peça foi arrematada pela impressionante soma de $13,980,000, no último dia 17 de junho de 2025, em Nova York. Maria Antonieta permanece, assim, como um forte catalisador para colecionadores, que buscam por algo raro e único, que contem uma história. Seu amor por joias e roupas caras acabou por lhe custa a reputação, valendo-lhe e título de “Madame Déficit”, e, por fim, a cabeça, naquele fatídico dia 16 de outubro de 1793.
Fontes:
LAZAZZERA, Milena. A Diamond Fit for a Queen: The Marie-Thérèse Pink and the Enduring Allure of Marie Antoinette. 2025 – Acesso em 24 de Junho de 2025.
LAZAZZERA, Milena. Marie Antoinette’s drama-filled pink diamond heads to auction. 2025 – Acesso em 24 de Junho de 2025.
MURPHY, Emilie. A diamond once owned by Marie Antoinette’s daughter, reimagined by JAR. 2025 – Acesso em 24 de Junho de 2025.













