Por: Renato Drummond Tapioca Neto
Em 1917, em meio ao forte sentimento anti-germânico que pairava sobre o Reino Unido em decorrência da Primeira Guerra Mundial, Lord Stamfordham, secretário privado do rei George V, teve uma brilhante ideia. A família real, os Saxe-Coburgo-Gota, era vista com desconfiança por seus próprios súditos, devido às suas conexões com os Hohenzollern da Alemanha. Assim, Stamfordham teria sugerido ao monarca um novo nome para a dinastia reinante, que soasse mais patriótico: Windsor!. A partir de então, todos os príncipes e princesas foram rebatizados em homenagem ao castelo medieval, que era o lar dos reis de Inglaterra desde o século XI. Em mais de 100 anos, a nem-tão-nova Casa Real produziu quatro reis e uma rainha, cujo reinado ultrapassou o de qualquer um de seus antecessores, tornando-se o mais longevo da história britânica. Agora, o Palácio de Buckingham celebra este acontecimento por meio de uma nova exposição. Intitulada “Royal Portraits: A Century of Photography” (Retratos Reais: Um Século de Fotografia), a amostra apresenta ao público registros fotográficos da realeza nunca antes vistos!

Fotografia da rainha-mãe, Elizabeth Bowes-Lyon, feita por Cecil Beaton. A imagem faz parte da nova exposição de fotografias da família real, que inclui notas manuscritas da realeza.

A princesa Elizabeth em trajes militares, por Cecil Beaton.

Um dos primeiros registros oficiais da jovem rainha Elizabeth II, feito por Dorothy Wilding.
Inaugurada na Câmara do Rei, no Palácio de Buckingham (sede oficial da monarquia desde os tempos da rainha Vitória), a nova exposição demonstra como a fotografia teve um papel importantíssimo na construção da imagem da família real. As fotos revelam tanto momentos jubilosos, como casamentos, batizados e coroações, quanto acontecimentos desastrosos, a exemplo dos bombardeios no Palácio durante a Segunda Guerra e o incêndio no castelo de Windsor, em 20 de novembro de 1992. “A Coleção Real”, diz o curador da Royal Portraits, Alessandro Nasini, “guarda algumas das fotografias mais duradouras já tiradas da família real, capturadas pelos fotógrafos de retratos mais célebres dos últimos cem anos”. Entre os fotógrafos homenageados pela exposição, se encontram os trabalhos de três mulheres, como Annie Leibovitz, Joanna Lumley e Dorothy Wilding. Esta última, por sua vez, foi uma importante fotógrafa da alta sociedade, que fez registros da família do rei George VI e os primeiros retratos oficiais da jovem rainha Elizabeth II, em fevereiro de 1952, para produção de novos selos e moedas.
Com efeito, um dos destaques da nova exposição se trata da primeira foto em cores de um membro da realeza, tirada por Madame Yevonde. Pioneira em seu trabalho, a fotógrafa defendia não só o uso de novas tecnologias para sua arte, como também maior presença feminina no ofício, até então liderado por homens. O registro feito pela artista captura o perfil da princesa Alice no dia de seu casamento, em 1935. A harmonia do retrato só é perturbada pelo olhar em 3/4 da retratada e pelo buquê de rosas vermelhas aos seus pés, contrastando com o marfim do vestido de noiva e com o branco das outras flores. Nas últimas décadas do reinado de Elizabeth II, as mulheres já estavam mais atuantes na Fotografia, a exemplo de Jayne Fincher, que fez belíssimos registros em conjunto da família dos Gales, por um período de aproximadamente 15 anos (entre 1981 e 1996) e depois publicou um livro com suas fotos da princesa Diana. Por falar na mais famosa princesa de Gales, existe uma comparação interessante entre o retrato que Paolo Roversi fez dos 40 anos de Kate Middleton, atual princesa, ao lado de uma fotografia de Franz Xaver Winterhalter retratando Alexandra da Dinamarca, a mulher que por mais tempo ostentou esse título, tirado cerca de 150 anos atrás.

A mais antiga fotografia colorida da realeza, tirada por Madame Yevonde. Retrata a princesa Alice no dia de seu casamento, em 1935.

Retrato oficial de Catherine “Kate” Middleton, ainda como duquesa de Cambridge. A foto é uma de três, tirada pelo fotógrafo Paolo Roversi, para marcar o aniversário de 40 anos da nova princesa de Gales. O retrato guarda uma notória semelhança com o de Alexandra da Dinamarca, tirado por Franz Xaver Winterhalter, quase 150 anos antes.

O príncipe Charles e a princesa Anne, em 1956, por Antony “Tony” Armstrong-Jones.
Outro nome importante, ligado à construção da imagem da realeza, é Cecil Beaton, cujo trabalho era muito apreciado pela rainha-mãe, Elizabeth Bowes-Lyon. Beaton era o fotógrafo oficial da consorte do rei George VI, capturando seu perfil em belíssimos registros e acompanhou a família real durante a transição de reinados, entre as décadas de 1940 e 1970. Graças ao incentivo de sua patrona, ele foi escalado para fazer as fotos oficiais da coroação da nova soberana, em 2 de junho de 1953. Conta-se que, num dado momento da sessão, o príncipe Charles e a princesa Anne corriam alegremente pela Sala Verde do Palácio de Buckingham, atrapalhando assim o trabalho do fotógrafo. De repente, as duas crianças foram apanhadas pela carinhosa avó, que sorria alegremente para os netos, encantada com suas brincadeiras. Esse momento ofereceu a Beaton um olhar mais humano e menos formal sobre a realeza. Rapidamente, ele tirou uma série de fotos da rainha-mãe entretida por Charles e Anne e depois ela abraçando seu neto mais velho, o atual rei Charles III.
Com efeito, Beaton já havia tirado outros retratos da rainha Elizabeth II, para além das imponentes fotos da coroação. Um dos registros que está na exposição se trata de uma fotografia da jovem princesa sorrindo para a câmera, em trajes militares, durante o período da Segunda Guerra Mundial. Na época, Elizabeth havia atuado como mecânica no Serviço Territorial Auxiliar. Uma pesquisa recente apontou que a soberana foi uma das mulheres mais fotografadas de todos os tempos, ao lado de nomes como Marilyn Monroe, sua contemporânea, da princesa Diana e de estrelas mais recentes, como Britney Spears. A rainha também se tornou um ícone da cultura pop, graças ao magnífico trabalho do renomado artista Andy Warhol, que usou uma técnica incluindo pó de diamante para capturar a luz com mais intensidade. Warhol fez várias versões de sua obra de arte, finalizada em 1985, que mistura paletas de cores contrastantes, oferecendo assim nova roupagem para a austeridade contida na expressão de Elizabeth. A exposição também apresenta uma visão mais moderna da fotografia real, com uma foto tirada por Rankin mostrando a rainha Elizabeth aos 75 anos, sorrindo na frente de um Union Jack.

Um retrato de Elizabeth II pelo renomado artista pop Andy Warhol (Todd-White Art Photography / Ben Fitzpatrick / Royal Collection Trust).

A princesa Margaret, por seu marido, Lord Snowdon, em 1967.

Uma das imagens inéditas da exposição consiste numa fotografia feita por Lord Snowdon, em 1964. O registro, nunca divulgado antes, apresenta a rainha Elizabeth II, a princesa Margaret, Katherine, duquesa de Kent, e a princesa Alexandra de Kent segurando seus bebês recém-nascidos.
Segundo o curador Alessandro Nasini, em um comunicado: “Ao lado dessas belas gravuras vintage, que não podem estar em exibição permanente por razões de conservação, estamos entusiasmados em compartilhar correspondências de arquivo e provas nunca antes vistas, que darão aos visitantes uma visão dos bastidores do processo de criação de retratos reais tão inesquecíveis”. Uma das fotografias, por exemplo, apresenta o pequeno príncipe Charles de pé em uma sala com vários espelhos, olhando para sua irmã, a princesa Anne. O registro foi feito em 1956, pelo então iniciante Antony “Tony” Armstrong-Jones, futuro marido da princesa Margaret. Seu trabalho mais famoso, porém, seria o retrato da irmã da rainha feito em 1959, no qual a princesa lança um olhar sedutor para a câmera, desnuda do colo para cima, exceto pela presença de suas joias. No futuro, Tony e Margaret fariam outras versões dessa imagem, notavelmente em 1967, abusando do jogo de sombras. Mais tarde, o então conde de Snowdon fez registros mais formais da realeza, especialmente da princesa Diana.
Uma das imagens inéditas da exposição consiste numa fotografia feita pelo próprio Lord Snowdon, em 1964. O registro, nunca divulgado antes, apresenta a rainha Elizabeth II, a princesa Margaret, Katherine, duquesa de Kent, e a princesa Alexandra de Kent segurando seus bebês recém-nascidos. A soberana aparece ao centro da imagem, segurando sua quarta criança nascida do casamento com o príncipe Philip: o príncipe Edward, atual duque de Edimburgo. Margaret então escreveu um bilhete para a irmã, referindo-se a ela pelo apelido de “Querida Lilibet”, pedindo o seguinte: “Você gostaria de assiná-lo e então eu vou pedir a Kate [a duquesa Katherine] para fazer o mesmo e enviá-lo para [o médico] como uma lembrança de dois meses extraordinários de parto”. A nota manuscrita é exibida ao lado da fotografia. Dessa forma, a exposição “Royal Portraits: A Century of Photography” é um lembrete pungente do poder que a fotografia possui de se conectar com as pessoas. Além disso, demonstra como essa arte não era apenas uma forma de construir a imagem do Estado, como também de capturar o lado mais humano daqueles que o representavam.
Fontes:
Smithsonian – Acesso em 23 de julho de 2024
Tatler – Acesso em 23 de julho de 2024














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