Em aproximadamente 45 anos de reinando, a rainha Elizabeth I da Inglaterra construiu cuidadosamente a sua imagem pública. Sua perícia na arte da representação foi tão acurada, que mesmo 460 após subir ao trono, a figura de uma soberana poderosa, com seus delicados colarinhos de renda, pele de marfim e perucas vermelhas, adornada com pérolas e pedras preciosas, continua a ser divulgada ao redor do mundo, sendo facilmente reconhecida. Seja em filmes, seriados, arte moderna, camisetas ou até mesmo em cartas de baralho, a imagem de Elizabeth permanece como referência para muitos artistas.
Conforme reatou Jonathan Jones para o jornal The Guardian, uma nova instalação de mídia mista, elaborada pelo artista britânico Mat Collishaw, apresenta uma versão bastante realista de como seria a última monarca Tudor durante os últimos anos de sua vida, enquanto envelhecia aos 55 anos de idade, a despeito dos retratos oficiais, que quase sempre a apresentavam como uma mulher jovem.

A “Máscara da Juventude”, criada por Mat Collishaw’ para representar a face da rainha Elizabeth I aos 55 anos de idade.
“A proliferação de retratos pareceu criar mais uma cortina de fumaça do que revelar seu verdadeiro caráter, que permaneceu oculto por trás de sua aparência inescrutável”, explica Collishaw, em uma entrevista publicada no blog Royal Museums Greenwich. “Anos de insegurança, devido ao clima político potencialmente volátil, levaram-na a criar uma máscara pública que se fundiu com seu “eu” privado, os dois se tornando inseparáveis.”
A criação de Collishaw, apropriadamente intitulada “A Máscara da Juventude”, torna esta teoria tangível ao justapor uma representação animatrônica, realística e pouco lisonjeira de Elizabeth com o triunfante “Retrato da Armada”, que foi pintado por volta de 1588, para comemorar o fracasso de Filipe II da Espanha na invasão das Ilhas Britânicas. Na parede de uma sala de exposições na Queen’s House, em Greenwich, Elizabeth aparece serena, onipotente e incrivelmente jovem para uma mulher de aproximadamente 55 anos. As pérolas no cabelo representando “castidade” da “Rainha Virgem” da Inglaterra, enquanto o colar de renda, o rufo, ao redor de seu rosto irradia “calor, beleza e bondade”, de acordo com o blog da RMG.

O Retrato da Armada, pintado em 1588.
Na parede oposta, porém, uma outra versão, mais realista, do rosto da rainha choca os visitantes, não apenas pelos assombrosos detalhes do rosto, como também pelo fato de que a face exposta é capaz de abrir e fechar os olhos e os lábios, como se estivesse despertando novamente para a vida. De acordo com Lucy Davies para o Telegraph, essa versão do rosto da rainha tem todas as características de sua idade: olhos fundos, rugas, pele marcada por varíola e até pelos finos. Sente-se a falta do famoso cabelo ruivo, para não mencionar seu corpo imponente. Em vez disso, ela é pouco mais que uma máscara de borracha instalada numa caixa de vidro. Atrás dela há uma confusão de máquinas zunindo que ditam seus movimentos, como os olhos piscando inquietamente e a boca trêmula; O efeito final, escreve Jamie Rigg para o Engadget, é o de uma rainha silenciosa examinando sua corte, e fisicamente desmascarada para revelar o rosto por trás da representação, embora ocultando seus pensamentos internos, como ela fazia nos seus retratos e em vida.

As duas Elizabeths são colocadas face-a-face, na Queen’s House, em Greenwich.
Com efeito, não é de surpreender que Elizabeth fosse adepta da arte de criar e manter uma imagem pública que representasse a grandeza do seu reinado: como a segunda filha de um rei que ansiava por filhos homens e produto de uma união anulada que terminou com a execução de sua mãe sob acusações forjadas de adultério, ela a passou a vida escondida atrás de uma máscara que ela própria inventou para se proteger. Havia poucas opções para ela, que sobreviveu à ascensão e queda dos reis e rainhas que governaram antes de assumir o poder – uma tarefa árdua que ela desempenhou escondendo suas verdadeiras intenções e seduzindo as pessoas à sua volta, até que sua irmã, Maria I, morreu sem filhos em 1558, deixando sua irmã Elizabeth como herdeira do trono.
Determinada a manter sua independência, a rainha de 25 anos decidiu permanecer solteira. Segundo Anna Whitelock, em matéria para o History Extra, o “corpo da rainha era considerado o mesmo que o da Inglaterra”. Quando Elizabeth era jovem, vivaz e aparentemente destinada a produzir um bando de herdeiros do sexo masculino, essa equação do privado e do público funcionava bem a seu favor. Mas, guando ela passou da idade fértil, com seus cabelos grisalhos, careca, com rugas e dentes podres, parcialmente mascarada por cosméticos e perucas pesadas, a ênfase na aparência se mostrou mais problemática.
Os retratos se tornaram então um método fundamental para manter o mito da beleza juvenil da rainha, conforme observa Davies ao The Telegraph. Perto do fim do seu reinado, Elizabeth divulgou uma espécie de “modelo de rosto”, que seus retratistas foram obrigados a aderir. Como Brenda Ralph Lewis do British Heritage relata, seu secretário de Estado, Sir Robert Cecil, escreveu certa vez que “muitos pintores fizeram retratos da Rainha, mas nenhum mostrou suficientemente sua aparência ou seus encantos. Portanto, Sua Majestade ordena a todos os tipos de pessoas que parem de fazer retratos dela até que um pintor inteligente tenha terminado um que todos os outros pintores possam copiar. Sua Majestade, entretanto, proíbe a exibição de qualquer retrato que seja feio, até que seja melhorado”.
Em uma entrevista concedida à BBC, a curadora do National Maritime Museum, Christine Riding, disse que a “Máscara da Juventude”, de Collishaw, foi produzida com base em informações biométricas tiradas de retratos pintados da rainha, uma varredura 3D de sua máscara mortuária e relatos contemporâneos acerca de sua aparência, embora não tenha a pretensão de fornecer uma representação definitiva de Elizabeth. “Isso é tão artificial quanto o ‘Retrato da Armada’”, explica Riding. “Pode ser mais realista, mas você pode ver a mecânica que está zumbindo toda vez que ela se move. Isso não é uma tentativa de dizer que isso é Elizabeth I. É outro tipo de artifício”. A “Máscara da Juventude” está em exibição na Queen’s House, em Greenwich, até 3 de fevereiro de 2019.
Fontes:
ECKARDT, Stephanie. Queen Elizabeth I Has Returned From the Grave. 2018 – Acesso em 09 de novembro de 2018.
SOLLY, Meila. What Did Elizabeth I Actually Look Like? This Artist Has a Suggestion. 2018 – Acesso em 09 de novembro de 2018.
Tem algum artigo ou poderia fazer um sobre ana de mendoza?
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