As joias de Maria Amélia de Nápoles: qual o destino das tiaras da última rainha dos Franceses?

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Nascida em 26 de abril de 1782, no Palácio Reggia di Caserta (Caserta, Itália), Maria Amélia de Nápoles e da Sicília era filha do rei Fernando I com a arquiduquesa Maria Carolina da Áustria. Possuía ilustres antepassados, como o rei Carlos III da Espanha e a Imperatriz Maria Teresa, a Grande. Não obstante, a soberana tinha profundas conexões com a nobreza europeia, sendo sobrinha de ninguém menos que Maria Antonieta, a malfadada esposa de Luís XVI. Mal sabia a jovem princesa que, quase quarenta anos depois da Revolução decapitar a irmã favorita de sua mãe, ela acabaria ocupando seu lugar no trono como rainha consorte dos Franceses, ao lado de seu marido, o rei Luís Filipe de Orléans. Pelo casamento, ela também foi tia de Napoleão Bonaparte, casado com sua sobrinha, a arquiduquesa Maria Luísa. Com o fim do Primeiro Império Francês e a queda da monarquia Bourbon, ela foi soberana consorte entre os anos de 1830 a 1848. Maria Amélia foi, portanto, a última mulher a usar o titulo de rainha na França. Após a queda da monarquia e a implantação da Segunda República Francesa (substituída pouco depois pelo Segundo Império), Maria Amélia e sua família se exilaram na Claremont House, em Hersham, no Reino Unido, onde a soberana veio a falecer aos 83 anos, em 24 de março de 1866.

A rainha Maria Amélia de Nápoles e da Sicília, usando o magnífico conjunto de diamantes e safiras. Tela de Louis Hersent, 1836.

Não obstante, a rainha Maria Amélia possuía conexões íntimas com a Casa Imperial do Brasil. Afinal, duas de nossas imperatrizes, Dona Leopoldina e Dona Teresa Cristina, eram suas sobrinhas. A esposa de D. Pedro I costumava se referir afetuosamente a ela em sua correspondência como “Minha querida titia”. Pelo casamento, ela também foi avó das duas filhas de D. Pedro II, as princesas Isabel e Leopoldina. Ambas se uniram em matrimônio com dois netos da rainha dos Franceses: Isabel com Gastão de Orléans, conde d’Eu, e Leopoldina com Augusto, duque de Saxe. Sua figura exerceu ainda especial fascínio sobre uma de suas descendentes, a princesa Isabelle, que chegou a lhe dedicar um livro. Não fosse a queda da monarquia em 1848, Isabelle teria sido rainha dos Franceses. Após a morte do rei Luís Filipe em 1850, os membros do partido orleanista do trono passaram a tratar seu neto, filho do príncipe Fernando Filipe, como conde de Paris. O título, por sua vez, seria passado para as gerações posteriores juntamente com as joias de rainha dos Franceses que pertenceram à Maria Amélia. Em 1931, a neta da princesa imperial do Brasil, Dona Isabel, condessa d’Eu, herdou as magníficas safiras e diamantes da rainha dos Franceses ao se casar com Henrique, conde de Paris.

Em 13 de agosto de 1911, nascia no Château d’Eu (Normandia, França), a princesa Isabelle de Orléans e Bragança, futura condessa de Paris. Batizada em homenagem à sua avó paterna e madrinha, a princesa Isabel do Brasil, a bebê era filha primogênita do príncipe Pedro de Alcântara com Elisabeth de Dobrzensky. Durante a infância, Isabelle foi educada em Paris, para onde seus pais haviam se mudado desde o ano de 1924. Parte do programa educacional da princesa contemplava viagens pelo continente, visitando seus parentes em diferentes países. Na década de 1930, porém, seu pai decidiu fixar residência no Palácio do Grão Pará, em Petrópolis, após a revogação do decreto que bania a família imperial do Brasil. Isabel chegou a frequentar o colégio Notre-Dame-de-Sion, embora por um curto período, uma vez que logo estaria noiva de seu primo em terceiro grau, o príncipe Henrique de Orléans, herdeiro do extinto trono da França. Os dois se casaram em 8 de abril de 1931, na Catedral de Palermo, na Sicília. A princesa tinha 19 anos na ocasião e seu marido, 22.

Isabelle, condessa de Paris, usando o conjunto de diamantes e safiras da rainha Maria Amélia.

Juntos, Isabelle e Henrique foram pais de 11 crianças, incluindo o futuro Henrique, duque da França e conde de Paris. Com a morte do sogro de Isabelle, João, duque de Guise, ela e seu marido se tornaram os próximos pretendentes do ramo Orléans à extinta Casa Real francesa, cujo último rei havia sido Luís Filipe, destronado em 1848. O casal chegou a frequentar o Brasil em algumas ocasiões, especialmente durante a Segunda Guerra Mundial, em busca de refúgio. De volta à França na década de 1950, Isabel se dedicou à atividade de escritora. Entre seus livros, encontra-se uma biografia da rainha Maria Amélia, de quem ela herdara uma belíssima coleção de diamantes e safiras (que Isabel doou mais tarde para o Museu do Louvre), um romance sobre Maria Antonieta e sua autobiografia, intitulada “De todo o meu coração”. Infelizmente, seu casamento resultou em desavenças que foram resolvidas com a mudança do casal para casas separadas, em 1970. Ela sobreviveria ao marido por quatro anos, antes de falecer em 5 de julho de 2003, em Chérisy, na França, aos 91 anos.

Entre as joias que Isabelle herdou ao se casar com Henrique, destacava-se o diadema de diamantes e safiras que pertenceu à Maria Amélia, última rainha dos Franceses, legado para as princesas consortes casadas com os pretendentes orleanistas da extinta monarquia. A última pessoa a deter a posse da joia e do belíssimo conjunto que a acompanha foi a princesa Isabelle de Orléans. Na imagem em destaque, a esposa de Henrique de Orléans, conde de Paris, usa o precioso diadema, juntamente com o colar e os brincos que fazem parte do seu conjunto. Composta por cinco elementos articulados, a joia possui um total de 24 safiras naturais do Ceilão (das quais 10 possuem um corte menor) e 1083 diamantes. Infelizmente, não sobraram registros de quem ou quando o diadema foi confeccionado. Sabe-se que a primeira pessoa a usá-lo foi a rainha Hortense de Beauharnais, seguida por Marie Amélie. Luís Felipe, na época duque de Orléans (futuro rei dos Franceses) comprou a joia diretamente das mãos da enteada de Napoleão Bonaparte, que chegou a ser rainha da Holanda.

Diadema de diamantes e safiras da rainha Maria Amélia, usado por Isabelle, condessa de Paris.

Muito provavelmente, o diadema fora montado por joalheiros parisienses no início do século XIX. Ao longo das décadas, ele foi passando por significativas transformações, conforme o gosto de cada época. A rainha Maria Amélia passou a joia em herança para seu neto, Louis-Philippe, conde de Paris. A partir de então, a belíssima peça, decorada com padrões florais foi legada para as princesas consortes do ramo orleanista, até chegar em Isabel, mais conhecida em seu tempo de vida pelo tratamento de Madame. Em 1985, o diadema foi adquirido diretamente das mãos do conde e da condessa pelo Museu do Louvre, onde hoje se encontra em exposição ao lado de outras joias da Coroa. Segundo uma história que foi passada de geração em geração por membros da família Orléans, os diamantes e as safiras pertenceram originalmente à fabulosa coleção de joias de Maria Antonieta, embora nenhuma documentação corrobore essa afirmativa. O mais provável é que a rainha Hortense tenha herdado o diadema de sua mãe, Joséphine de Beauharnais, primeira imperatriz consorte dos Franceses.

Outra joia que merece menção é a belíssima tiara de diamantes e safiras de Maria Amélia de Bourbon-Duas Sicílias. Diferentemente da maioria das joias da Coroa, que pertenciam ao Estado, a peça em destaque era propriedade privada da soberana, podendo ser legada para seus herdeiros. A tiara é composta por sete rosetas com safiras de corte oval, oriundas do Sri Lanka, circundadas por diamantes. Entre elas, destacam-se seis safiras menores. A peça foi confeccionada pelo Joalheiro parisiense Bapst e acompanhava um conjunto seguindo o mesmo design, composto por três broches, um par de brincos e uma uma grande gema central, que podia ser usada ora como fivela de cinto, ora como fecho para um bracelete. A rainha Marie Amélia foi retratada usando a tiara presa ao seu chapéu com plumas no ano de 1836, por Louis Hersent.

A tiara de diamantes e safiras da rainha Maria Amélia.

Como se pode observar na foto da tiara e na tela abaixo, a delicada armação está assentada em uma fileira de pérolas e outra de diamantes. A rainha carregou a joia consigo em 1848 para a Inglaterra, onde a família real passou a viver exilada após a queda da monarquia e a implantação da Segunda República Francesa. Antes de morrer, em 1866, a soberana passou a joia e as demais partes de seu conjunto para seu filho mais novo, Antoine, duque de Montpensier. Por mais de 150 anos, a tiara permaneceu em posse dos descendentes do duque até a década de 1990, quando os membros da família Orléans leiloaram o conjunto completo, que vinha dentro de um luxuoso estojo forrado com veludo e seda carmesim.

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