A despedida da “mãe dos brasileiros”: a morte da imperatriz Dona Teresa Cristina!

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Às 14h do dia 28 de dezembro de 1889, falecia na cidade do Porto, em Portugal, a imperatriz Teresa Cristina, aos 67 anos. A soberana vinha enfrentando problemas de saúde já há algum tempo, que se agravaram após o banimento da família imperial, em 16 de novembro de 1889. Com a Proclamação da República, a família imperial foi expulsa do país, carregando consigo apenas seus bens de uso pessoal. Teresa passava noites sem conseguir dormir, causando verdadeira preocupação entre seus circundantes. Um decreto do governo provisório, datado de 21 de dezembro, ratificava seu exílio, como também os impedia de manter propriedades no Brasil. Para Roderick J. Barman, “a notícia aniquilou a vontade de viver de D. Teresa Cristina” (2012, p. 522). Ela se queixava de frio e de dor nas costas e pedia com urgência para que um padre fosse chamado, sentindo que seu momento final se aproximava. Os ataques de asma se tornaram cada vez mais constantes naquele quarto frio do Grande Hotel do Porto e ela não resistiu. A soberana veio a óbito depois de sofrer uma parada respiratória, que levou a uma parada cardíaca.

Retrato da imperatriz Teresa Criatina de Bourbon, pintado no final do século XIX pela artista francesa Joséphine Houssaye (acervo do Museu Imperial de Petrópolis).

Quando soube da morte da Imperatriz do Brasil, a rainha Vitória escreveu no seu diário: “Muito chocada em saber da morte da pobre imperatriz do Brasil em Oporto, após somente alguns dias adoentada. A revolução sem dúvida matou-a. É triste demais”. D. Pedro II, porém, não responsabilizou o novo regime. O monarca passara o dia 28 passeando, sem acreditar que o estado de saúde da esposa fosse tão grave, até que lhe chamaram às pressas na Academia de Belas-Artes. Enquanto o corpo de D. Teresa era embalsamado, ele anotou: “Não, não posso crer que meus patrícios talvez concorressem para a morte de quem verdadeiramente mais amei. Foi uma crueldade, e eu a causa, por ter me dado quase 50 anos de ventura! Quanto deverei mitigar com lágrimas essa última dor que ela quis compartilhar! Ninguém sabe como era boa, e sofria mais pelos outros do que por si (apud BARMAN, 2021, p. 524). Assim que soube da morte da imperatriz Teresa Cristina, em 28 de dezembro de 1889, o visconde de Ouro Preto, também exilado em Portugal, foi visitar D. Pedro II no Grane Hotel do Porto acompanhado de seu filho, Afonso Celso, para prestar suas condolências ao monarca deposto.

Encontraram o Imperador lendo, com a cabeça apoiada numa das mãos. “Eis o que me consola”, disse ele, apontando para o livro que lhe distraia a mente, uma nova edição de “A Divina Comédia”. Debateram sobre vários temas acerca da obra de Dante, sem trocar uma palavra acerca da morte da soberana. Apenas ao final da conversa, D. Pedro indicou onde ficava a câmara mortuária com o corpo daquela que foi sua companheira por 46 anos. Quando saíram do quarto, os visitantes se depararam com o soberano “ocultando o rosto com as mãos magras e pálidas”. O Imperador, que até pouco tempo tentava se manter forte, chorava. “Por entre os dedos corriam-lhe as lágrimas, deslizavam-lhe ao longo da barba nívea e caíam sobre as estrofes de Dante”, recordou Afonso Celso. Segundo Heitor Lyra (2021, p. 953), D. Pedro teria dedicado este versos a D. Teresa:

Corda que estala a harpa mal tangida,

Assim te vais, ó doce companheira

Da fortuna e do exílio, verdadeira

Metade de minh’alma entristecida!

De augusto e velho tronco haste partida

E transplantada à terra brasileira,

La te fizeste a sombra hospitaleira,

Em que todo infortúnio achou guarida.

Feriu-te a ingratidão no seu delírio;

Caíste, e eu ficaste a sós, neste abandono,

Do teu sepulcro vacilante círio!

Como foste feliz! Dorme o teu sono…

Mãe do povo, acabou-se o teu martírio;

Filha de reis, ganhaste um grande trono!

Efígies tumulares de Dona Teresa Cristina e D. Pedro II na Catedral de São Pedro de Alcântara, em Petrópolis-RJ.

Depois de embalsamado, o corpo da Imperatriz foi exposto na Igreja da Lapa, no Porto. De acordo com o depoimento de Benedita de Castro para a esposa de Eça de Queirós: “O enterro da Imperatriz foi um acontecimento. Foi feito com muito respeito e todos mostraram muito sentimento”. Incrédulo, D. Pedro II escreveu que “abriu-se na minha [vida] um vácuo que não sei como preencher. […] Nada pode exprimir quanto perdi: que noite vou passar! Dizem que o tempo tudo desfaz! Mas poderei viver tempo igual ao da minha felicidade?”. O ataúde com o corpo de Dona Teresa Cristina, originalmente sepultado no Panteão dos Bragança no Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa, foi transladado para o Brasil em 1921, juntamente com o de D. Pedro II. Hoje, o casal imperial compartilha um túmulo imponente na Catedral de São Pedro de Alcântara, em Petrópolis.

O legado de Dona Teresa Cristina, porém, sobreviveu. Seu incentivo às artes dramáticas, à imigração italiana, às pesquisas arqueológicas e aos trabalhos de filantropia ajudaram a difundir uma imagem da nação que seria aprimorada com o passar dos anos. Em 45 anos de casamento, sua presença foi de suma importância para que D. Pedro criasse confiança em seu papel como monarca constitucional e consolidasse nos trópicos uma monarquia assentada em base mais sólidas, que colocava a família real na posição célula mater da nação; um modelo no qual seus habitantes poderiam se espelhar. Recentemente, a figura de Dona Teresa Cristina de Bourbon vem recebendo grande número de admiradores, graças à produção da rede Globo, “Nos Tempos do Imperador” (novela de Thereza Falcão e Alessandro Marson). Interpretada pela atriz Letícia Sabatella, o público de telespectadores está (re)conhecendo as múltiplas faces de uma soberana que passou para a posteridade como a “mãe dos brasileiros”.

Referências Bibliográficas:

AVELLA, Aniello Angelo. Teresa Cristina de Bourbon: uma imperatriz napolitana nos trópicos 1843-1889. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2014.

BARMAN, Roderick J. Imperador cidadão. São Paulo: Editora UNESP, 2012.

BURKE, Peter. A fabricação do rei: a construção da imagem pública de Luís XIV. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar.

CALMON, Pedro. História de D. Pedro II. Rio de Janeiro: José Olympio, 1975, 5vols.

CARVALHO, José Murilo de. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

DEL PRIORE, Mary. Condessa de Barral: a paixão do imperador. Rio de Janeiro: Objetiva, 2008.

SCHWARCZ, Lilia Moritz. As barbas do imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

TJÄDER, Rogerio da Silva. Sua Majestade Imperial D. Thereza Christina Maria de Bourbon e Bragança. Editora Capivara, 2015.

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