Coroas Reais: os símbolos de autoridade e opulência no regime monárquico! – Parte III (Final)

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Considerada o símbolo mais representativo do poder dos antigos reis e imperadores, a Coroa e os outros elementos da Regalia Real, como o Orbe e o Cetro, estavam presentes nas cerimônias de coroação dos monarcas europeus desde a Idade Média, sendo igualmente utilizadas em outras cerimônias oficiais de Estado, como na abertura anual do Parlamento no Reino Unido, ou em funerais. Soberanos também usavam coroas nos campos de batalha, para serem facilmente identificados entre suas tropas. Logo, seu uso foi acolhido em outras parte do mundo, como na América, na África e na Ásia. Seja nos retratos pintados ou nas imagens heráldicas, as joias da Regalia Real desempenhavam assim um importante papel na composição da imagem pública do monarca e de seu status “semidivino”. Atualmente, poucas monarquias, com exceção da britânica, mantém o costume de coroar seus reis e rainhas. As coroas e os demais ornamentos se tornaram principalmente elementos simbólicos de sua posição enquanto Chefes de Estado. Porém, mesmo expostas em Museus e/ou em Palácios, tais peças possuem uma história incrível para contar, envolvendo disputas familiares pelo poder, guerras e o declínio de Dinastias outrora poderosas. Nesta matéria, selecionamos algumas das Coroas mais interessantes e o contexto histórico no qual essas magníficas peças foram produzidas!

A COROA DO SACRO-IMPÉRIO ROMANO-GERMÂNICO

A coroa usada pelos antigos soberanos do Sacro-Império Romano-Germânico. A peça foi forjada em ouro no século X, com cenas religiosas gravadas em esmalte e circundadas por pérolas naturais e pedras preciosas incrustradas na base e no topo. Atualmente, se encontra preservada no Tesouro de Viena, na Áustria.

COROA IMPERIAL AUSTRÍACA

A coroa imperial austríaca. Foi criada em Praga, no ano de 1602, por Jan Vermeyen para o imperador Rudolf II. A peça era usada apenas em ocasiões privadas até 1804, quando se tornou a coroa oficial do Império Austríaco, usada na coroação do imperador Francisco I. Atualmente se encontra exposta no palácio de Hofburg (Viena).

A COROA REAL DA SUÉCIA

Uma das joias mais importantes da Regalia Real da Suécia é a coroa do rei Eric XIV, feita em 1561 na capital do reino, Estocolmo. Seu design em puro estilo renascentista foi pensado pelo Ourives flamengo Cornelius ver Welden. No século XVI, a peça apresentava as iniciais E. R., de “Ericus Rex”, coberta com esmalte turquesa entre a gema central do aro, um grandioso rubi de lapidação elíptica. Após a deposição do monarca por seu irmão, John III, a peça passou por modificações. As iniciais de Eric foram removidas e em seu lugar foram acrescentados dois nichos contendo duas pérolas cada. A coroa do rei Eric se destaca por sua beleza singular. Mais do que um ornamento que simbolizava o poder do soberano sueco, a peça é uma verdadeira obra-prima da arte da ourivesaria no período quinhentista. Embora outras casas dinásticas, cujos membros governaram a Suécia, como os Palatinado-Zweibrücken, os de Hesse e os Holstein-Gottorp, tenham dado preferência à coroa da rainha Cristina, feita no século seguinte, a antiga Coroa de Estado retornou ao seu lugar de destaque durante a regência da Casa de Bernadotte, tornando-se a peça oficial que representa o reino.

Sua estrutura consiste em um aro de ouro maciço com quatro semiarcos, unidos ao topo por um orbe de ouro com uma cruz de diamantes. Por toda a joia, podemos observar um delicado padrão esmaltado, decorado com muitas pérolas, diamantes, esmeraldas e rubis. Entre os semiarcos e na base de cada um deles, nota-se a presença de oito placas de ouro em alto-relevo, com diamantes lapidados em formato de gotas nas pontas (instalados em 1818). Entre cada uma das placas, outras menores, adornadas com três pérolas. O interior, por sua vez, é forrado com veludo carmesim. Ao longo dos anos, a peça passou por várias modificações, que deixaram sua aparência bastante distante da versão original. Para além das mudanças feitas por John III, o rei Charles XIV John substituiu o orbe renascentista por outro esmaltado de azul, incrustrado com pequenos diamantes e com uma cruz no topo. O forro de veludo carmesim também fora substituído por um bordado a ouro. Apenas em 1970 a peça foi restaurada o mais próximo possível de sua aparência em 1561. Não apenas o orbe original, com seu belíssimos padrões combinando com o restante da armação, fora reinstalado no topo, como também as iniciais do rei Eric foram reveladas entre a gema central. Atualmente, a Coroa Real da Suécia permanece em exposição na Sala do Tesouro, no Palácio em Estocolmo.

COROA E REGALIA REAL DA DINAMARCA

As belíssimas joias reais e a Regalia da Coroa da Dinamarca. Hoje propriedade do Estado, as peças também estão à disposição da rainha Margrethe II, atual soberana. Elas podem ser divididas em quatro grupos ou partes, que consistem em três coroas, um cetro, um orbe e um recipiente contendo o óleo sagrado da cerimônia de coroação. Anteriormente, mais itens faziam parte da Regalia, mas alguns deles foram vendidos em 1523 pelo rei Christian II e outros na década de 1620 pelo rei Christian IV. O primeiro monarca coroado da Dinamarca foi Knud VI, em 1170, na Igreja de Ringsted. Até o ano de 1648, todos os soberanos dinamarqueses seguiram os mesmos ritos cerimoniais, quando então a Dinamarca se tornou uma monarquia eletiva, com o primogênito do rei sendo escolhido pelo Conselho Privado. Assim sendo, Frederik III foi o primeiro rei simbolicamente coroado pelos seus Conselheiros. Durante seu reinado, a Dinamarca se tornou uma monarquia absolutista e seu filho, Christian V, tornou-se rei imediatamente após a morte de Frederik III, em 1670.

Todavia, os antigos rituais da coroação não foram ressuscitados e o novo soberano se autocoroou com uma coroa feita a partir da de seu pai, cujo ouro havia sido derretido para a confecção de uma nova peça, que ficou conhecida como “a coroa dos monarcas absolutistas”. Em seguida, Christian V se dirigiu à Igreja, onde foi ungido com o óleo sagrado para, dessa forma, mostrar ao povo que havia sido abençoado por Deus. Em 1848, porém, a monarquia absolutista deu lugar a uma monarquia constitucional. O último rei absoluto da Dinamarca, portanto, foi Christian VIII, coroado em 1839. Desde então, a coroa real é usada por ocasião do funeral de um monarca, quando ela é colocada sobre a tampa de seu caixão, erguido sobre um palanque no Palácio da Igreja de Christiansborg. As outras partes da Regalia, por sua vez, são dispostas aos pés do ataúde. Quando não são usadas, as joias reais costumam ser exibidas na Câmara do Tesouro, no Castelo de Rosenborg.

A COROA DE ANNA IVANOVNA DA RÚSSIA

A coroa da imperatriz Anna Ivanovna, segunda mulher a governar a Rússia por direito próprio no século XVIII. Sobrinha do famoso czar Pedro I (também conhecido como Pedro, o Grande), a coroa da soberana possui um formato de mitra bispal, encimada por uma cruz de diamantes sobre uma imensa turmalina vermelha. Suas laterais são envolvidas por um total de 2.500 diamantes, incluindo rubis e turmalinas, dispostos em padrões geométricos. Anna Ivanovna chegou ao poder em 30 de janeiro de 1730, após a morte de seu primo, Pedro II. Nesse mesmo ano, ela encomendou aos Joalheiros e Ourives da Coroa, Samson Larionov e Nikita Milyukov, a confecção da peça para sua cerimônia de coroação, que o ocorreu no dia 28 de abril do mesmo ano. Sua armação em prata dourada possui 31,3 cm de altura. Uma vez pronta, Anna foi retratada usando a coroa em uma tela magnífica, pintada por Louis Caravaque. Com efeito, a soberana também possuía uma versão menor da joia, feita especialmente para ocasiões menos solenes. Após a morte da czarina, em 1740, sua coroa acabou sendo substituída pela fabulosa peça encomendada por Catarina, a Grande, em 1762. A coroa da imperatriz Anna seria usada pela última vez em 1826, quando o czar Nicolau I fora proclamado rei da Polônia. Depois disso, a peça ficou guardada junto às outras coroas russas, na sala dos diamantes do Palácio de Inverno. Após a Revolução Russa de 1917, a maior parte das joias dos Romanov foram desmontadas e vendidas para compradores anônimos. Contudo, a coroa de Anna Ivanovna, assim como a de Catarina II, fora mantida pelo novo governo no Fundo de Diamantes do Kremlin. Atualmente, a peça pode ser admirada pelo visitante no Museu, localizado em Moscou, ao lado de outras joias que compõem a Regalia Imperial dos Romanov.

A COROA IMPERIAL RUSSA

A fabulosa Coroa Imperial Russa, símbolo definitivo da soberania dos czares, encomendada por Catarina por II em 1762 a Ivan Betskoy, seu conselheiro, para ser usada na sua cerimônia de coroação em 22 de setembro. Na descrição feita por Robert K. Massie:

Na forma de uma mitra bispal, era encimada por uma cruz de diamantes sobre um imenso rubi de 389 quilates. Abaixo, 44 diamantes com mais de dois centímetros cada cobriam a faixa horizontal que encobriam a cabeça e o arco central onde se apoiava o rubi*, com as laterais que envolviam toda a coroa repletas de uma massa sólida de diamantes menores. De cada lado do arco central, 38 pérolas rosadas circulavam a coroa, da testa à nuca (MASSIE, 2013, p. 336).

Na verdade, a pedra se trata de um espinélio vermelho de 384 quilates, facilmente confundido com um rubi. Depois de Catarina II, a Coroa Imperial seria utilizada por todos os seus sucessores. A última vez foi em 26 de maio de 1896, durante a coroação de Nicolau II, o último czar. Após a Revolução Russa de 1917, a magnífica peça ficou sob custódia do novo regime. Diferentemente das outras joias da família imperial, que foram vendidas para compradores anônimos, a Coroa foi mantida no Tesouro Nacional do Kremlin, devido à sua importância histórica. Na época, ela chegou a ser avaliada em 52 milhões de dólares, mas atualmente o governo russo considera seu valor incalculável, com suas 11.427 gemas, somando um total de 2.313 quilates.

A COROA REAL DA FRANÇA

A Coroa Real da França, réplica encomendada em 1821 pelo rei Luís XVIII ao joalheiro Feuchère, para o aniversário de 20 anos da execução do irmão do monarca, que ocorreria em 1823. Durante a Fase do Terror da Revolução Francesa, com Luís XVI decapitado e a rainha Maria Antonieta feita prisioneira, aguardando seu julgamento, a Assembleia Nacional deu ordem para que todas as joias de Estado fossem desmontadas e suas pedras vendidas. Das 20 coroas reais que existiam na França até 1793 (a mais antiga delas remontava a Carlos Magno), apenas a do rei Luís XV conseguiu sobreviver. Logo, a peça que hoje se encontra em exposição na Basílica de Saint-Denis, na França, ao lado de outras Regalias Reais, como a coroa de rainha consorte e o cetro com a Mão da Justiça, são réplicas feitas pelo joalheiro Feuchère, com base em desenhos feitos a partir da observação dos originais, da autoria de Bélanger e Hitorff. Uma vez prontas, as peças acabaram sendo utilizadas no funeral do próprio Luís XVIII, em 1824. Seu irmão e sucessor, Carlos X, preferiu utilizar a coroa de Luís XV na sua coroação, por se tratar de uma peça original da monarquia antes da Revolução.

A Coroa Real de 1823 foi confeccionada em bronze dourado e decorada com camafeus e pérolas. Seus oito semiarcos são unidos no topo por uma enorme flor-de-lis, símbolo da Dianastia Boubon. Com a queda de Luís Felipe em 1848, as novas joias de Estado ficaram em exibição no Museu dos soberanos franceses, criado por Napoleão III, mas que durou só até a proclamação da Terceira República, em 1870. Depois disso, o paradeiro da Coroa e da Regalia Real é um tanto confuso. Esquecida em um depósito no Château de Compiègne, ela foi enviada para a Catedral de Reims em 1949, local tradicional onde ocorriam as cerimônias de coroação dos antigos reis. No ano de 1952, porém, elas foram roubadas e desmontadas. Após uma ordem de buscas emitida pelo governo, partes de sua armação foram encontradas numa vala. Em seguida, a peça foi restaurada e os camafeus perdidos foram substituídos por réplicas. Finalmente, a joia foi enviada para a Basílica de Saint-Denis, onde se encontra até hoje.

A COROA REAL DE HANÔVER

A Coroa Real do antigo Reino de Hanôver, criado em outubro 1814 pelo Congresso de Viena. Antes conhecido como Eleitorado de Hanôver, seus príncipes se tornaram soberanos do Reino Unido após a morte da rainha Anne da Casa Stuart, em 1714, passando a Coroa para seu primo em terceiro grau, que se tornaria o rei George I (ancestral direto da atual rainha Elizabeth II). Confeccionada em ouro, a coroa apresenta o padrão clássico de outras peças do mesmo gênero em outras monarquias da Europa, com oito semiarcos que se erguem da base ao topo, unidos por um orbe (nesse caso, esmaltado de azul com uma cruz pátea). As bordas, por sua vez, são decoradas com um padrão de fios entrelaçados e no aro se pode ver a presença de molduras em alto relevo ao redor das safiras e rubis engastados na armação. Com efeito, a presença de pequenas arestas no aro da base indica que a joia era decorada com mais gemas, que foram removidas posteriormente, assim como no centro da cruz pátea sobre o orbe e no meio dos florões que servem se suporte para os semiarcos. A coroa está assentada sobre uma faixa de pele de arminho, com o interior forrado em veludo carmesim.

Após sua emancipação enquanto reino, George III da Inglaterra fora reconhecido como primeiro monarca de Hanôver. A partir de então, os soberanos britânicos passaram a acumular mais um trono, seguindo a linha de sucessão do Reino Unido, com George IV herdando a coroa do pai e em seguida seu irmão, William IV. Após a morte deste último, uma mulher ascendeu ao trono inglês, Vitória. Contudo, no reino de Hanôver vigorava a Lei Sálica, que excluía as mulheres da sucessão. Sendo assim, o tio de Vitória, Ernest August (irmão mais novo de seu falecido pai, Edward, duque de Kent), tornou-se soberano daquele pequeno reino germânico. Seu último monarca fora George V, filho de Ernest e primo de Vitória. Em 1866, Hanôver fora conquistado pela antiga Prússia e, portanto, deixara de existir enquanto Reino Independente. Apenas em 1946 sua soberania fora revivida, após a derrota da Alemanha na Segunda Guerra, mas por pouco tempo. Hoje, seu território se fundiu com estados menores, que formam a Baixa Saxônia.

COROA DE GUILHERME II DA ALEMANHA

A coroa do kaiser Guilherme II, feita em 1888 para representar seu poder como rei da antiga Prússia (embora Guilherme também fosse imperador da Alemanha, nenhuma coroa fora confeccionada para simbolizar seu status imperial). Também conhecida como Coroa Hohenzollern, a peça era utilizada principalmente para fins heráldicos. Sua armação em ouro amarelo é engastada com 160 diamantes, dos quais 142 possuem lapidação rosa, decorando tanto o aro da base quanto os oito semiarcos assentados em delicados florões de quatro pontas, que se usem no topo sobre uma grande safira lapidada em formato de orbe. Em cima da gema, pode-se ver uma cruz cravejada de diamantes. Oito grandes pérolas imperiais em formato de gota também foram engastadas entre os semiarcos. Com a abdicação de Guilherme II em 1918 (ano da rendição alemã na Primeira Guerra Mundial), ele recebeu, contudo, permissão para manter as joias de Estado, incluindo a Coroa Hohenzollern. Durante a Segunda Guerra, a peça foi enviada em segurança para uma Igreja, onde ficou escondida dentro de um compartimento secreto na parede da cripta. Terminado o conflito, a joia retornou para a antiga família imperial e atualmente se encontra em exposição no belíssimo Castelo Hohenzollern.

A COROA DA IMPERATRIZ FARAH DA PÉRSIA

Coroa de Farah, imperatriz consorte da Pérsia, criada para a sua coroação em 1967. A peça foi projetada pelos joalheiros franceses Van Cleef & Arpels. As pedras foram escolhidas a partir de gemas soltas do tesouro imperial, agrupadas sobre uma armação de ouro branco. A coroa é composta por 36 esmeraldas, 105 pérolas, 34 rubis e 1.469 diamantes.

Referências Bibliográficas:

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_. Era dos extremos: o breve século XX: 1941-1991. Tradução de Marcos Santarrita. 2ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

KELLEY, Kitty. Os Windsor: radiografia da família real britânica. Tradução de Lina Marques et. al. Sintra, Portugal: Editorial Inquérito, 1997.

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MASSIE, Robert K. Catarina, a Grande: retrato de uma mulher. Tradução de Ângela Lobo de Andrade. Rio de Janeiro: Rocco, 2012.

MONTEFIORE, Simon Sebag. Os Románov: 1613-1918. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

PRICE, Munro. A queda da monarquia francesa: Luís XVI, Maria Antonieta e o barão de Breteuil. Tradução de Julio Castañon Guimarães. – Rio de Janeiro: Record, 2007.

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