Mademoiselle Boullan: Uma história de amor e ódio na corte dos Tudor – Notas do Autor

A Outra

Foto promocional do filme “A Outra”, com Natalie Portman como Ana Bolena, Eric Bana como Henrique VIII e Scarlett Johansson como Maria Bolena.

Em um dia qualquer, de um mês que não me recordo, do ano de 2009, ouvi dos lábios de minha professora de História: “Henrique VIII rompeu com a igreja para se casar com Ana Bolena, que era uma concubina”. Não dei muita atenção para o que ela acabava de dizer, até porque acreditava que o movimento reformista na Inglaterra era nada comparado com o luteranismo ou o calvinismo. Permaneci em minha mente com a imagem de uma mulher qualquer e indigna de atenção, até que no início do ano seguinte, quando estava no primeiro semestre da faculdade de História da UESC, assisti à superprodução cinematográfica “A Outra”, que é baseado no romance de Philippa Gregory. A partir de então, me senti intrigado com os elementos iconográficos do filme, incluindo seus personagens, dos quais a figura da rainha Ana me envolveu em uma profunda onda de magnetismo que eu jamais sentira por qualquer outro agente da História (exceto, um ano depois, por Maria Antonieta). Intrigado com a atuação eletrizante dada por Natalie Portman ao papel que interpretava, resolvi investigar mais sobre aquela mulher que viveu em meio a uma época de tempestade ideológica, fomentada pelo ardor dos homens.

 À medida que fui aprofundando mais em meus estudos percebi que aquela Ana Bolena era uma pessoa totalmente diferente da que eu acreditava conhecer. Passei então a buscar mais e mais livros e textos que sobre sua vida ou que estivessem ligados ao período em que viveu, e nesses três anos de exaustiva pesquisa tornou-se pra mim um fato de que era ela quem eu queria para o meu projeto de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Mantendo contado com os principais autores encarregados da dura tarefa de dissertar sobre essa mulher incrível, pus-me em frente de uma Ana multifacetada: a criança prodígio que encantou a corte de Bruxelas e de França; a jovem apaixonada por Henry Percy; a mulher ressentida e determinada a vingar quem causara seu infortúnio; a enamorada do rei; a rainha; a soberana política; a patrona da reforma em Inglaterra; a mãe; a acusada; a vítima; a esposa decapitada. Muitas fases podem-se identificar na trajetória deste ícone, mas em vez delas me revelarem respostas acerca de sua personalidade, me fizeram (e ainda fazem) levantar uma série de questionamentos para os quis talvez nunca encontre respostas. Ana Bolena passara a ser então um mistério pra mim, e espero que assim o seja pra sempre. Creio que esse é um de seus grandes encantos: a áurea de misticismo que carrega.

Contudo, não conseguiria completar essa série sem o auxílio de amigos que me ajudaram durante esses três anos de pesquisa, e cujo apoio vou precisar por ainda muito mais tempo, como minhas caras amigas Luiza Fonseca de SouzaGermana Almeida e Maria Helena (proprietária do blog “O Diário de Ana Bolena”). Todas as conversas que tivemos me proporcionaram a clareza de pensamento e sensibilidade para tratar com meu objeto de estudo de forma adequada. Não obstante, possuo uma dívida eterna com Lady Antonia Fraser, cujo livro “As Seis Mulheres de Henrique VIII” foi uma chave para me fazer entender os acontecimentos da Inglaterra do século XVI e dos seus principais atores. Todavia, seria quase impossível estar pesquisando sobre a vida de mademoiselle Boullan sem deixar de se encantar com sua arque inimiga, Catarina de Aragão. Suas determinações em não aceitar as decisões do marido também tiveram um forte peso no rumo dos acontecimentos e ela sempre será digna de meu respeito. Acredito que a melhor biografia já escrita sobre a filha dos reis Católicos é a de Garrett Manttingly, e foi-me imprescindível para compor esta análise.

Possivelmente, a melhor biografia de Ana Bolena é a do professor Eric Ives, The Life and Death of Anne Boleyn, ainda não lançada aqui no Brasil. Seu método de exposição difere do de Antonia Fraser à medida que ele não se atém a uma linearidade dos acontecimentos, utilizando-se dos fatos para explorar as várias representações da rainha. Sua escrita não é carregada do ceticismo de Alison Weir, por exemplo, nem do romantismo de Carolly Erikson. Assim como Ives, tentei não exaltar demais a figura de Ana, mostrando-a não como uma mártir do movimento reformista, mas sim como uma mulher suscetível aos vícios humanos, mas repleta daquela energia que tem o poder de conquistar os homens mesmo anos depois de morta. Ao estudar sua trajetória, não pude deixar de imaginar o que teria acontecido se seu caminho não cruzasse com o do rei, ou se no desenrolar dessa trama ela tivesse morrido de morte natural. Possivelmente as coisas não teriam chegado aos extremos que chegaram e só por isso sua presença mostra-se-nos relevante. A cruel execução a que sofrera proporcionou um “quê” a mais em sua lenda: a de uma pessoa que amou e que viveu do mesmo jeito que nós, mas que batalhou por um lugar de consideração no seio da sociedade. Sua luta, entretanto, não despareceu com ela, mas permaneceu ativa, correndo nas veias de sua única descendente: Elizabeth I, soberana de uma era dourada; o fruto da reforma; a verdadeira filha de sua mãe.

Renato Drummond Tapioca Neto

Graduando em História – UESC

Para compor esta série, fora consultada a seguinte bibliografia:

ALMEIDA, Ana Paula Lopes Alves de. Ana dos mil dias: Ana Bolena, entre a luz e a sombra da reforma henriquina.  – Porto, Portugal: [s.n.], 2009.

DWYER, Frank. Os Grandes Líderes: Henrique VIII. Tradução de Edi G. de Oliveira. – São Paulo: Nova Cultural, 1988.

FRASER, Antonia. As Seis Mulheres de Henrique VIII. Tradução de Luiz Carlos Do Nascimento E Silva. 2ª edição. Rio de Janeiro: BestBolso, 2010

ERIKSON, Carolly. Ana Bolena: Un Amor Decapitado. Tradução de León Mirlas – Buenos Aires, Argentina: Atlántida, 1986.

HACKETT, Francis. Henrique VIII. Tradução de Carlos Domingues. – São Paulo: Pongetti, 1950.

IVES, Eric W. The life and death of Anne Boleyn: ‘the most happy’. – United Kingdom: Blackwell Publishing, 2010.

LOADES, David. As Rainhas Tudor – o poder no feminino em Inglaterra (séculos XV – XVII). Tradução de Paulo Mendes. – Portugal: Caleidoscópio, 2010.

MATTINGLY, Garrett. Catalina de Aragón. Tradução de Ramón de La Serna – Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1942.

WEIR, Alison. The lady in the tower: the fall of Anne Boleyn. – New York: Ballantine Books, 2010.

1.1  – Romances Históricos

GREGORY, Philippa. A Irmã de Ana Bolena. Tradução de Ana Luiza Borges. 4ª edição. Rio de Janeiro: Record, 2010

MAXWELL, Robin. O Diário Secreto de Ana Bolena. Tradução de Maria do Carmo Romão. 3ª edição. Lisboa, Portugal: Planeta, 1997

1.2 – Filmografia

“The Other Boleyn Girl” (2008), Sony Pictures Home Entertainment.

6 comentários sobre “Mademoiselle Boullan: Uma história de amor e ódio na corte dos Tudor – Notas do Autor

  1. Olá, estava justamente pesquisando sobre temas para o meu Tcc e em um estalo me lembrei de Ana Bolena e Henrique VIII é impressionante como as idéias fluem rapidamente quando se tem um tema! Simplesmente adorei sua descrição sobre o tema. Entretanto, sou uma pessoa pobre (kkkk) e a biblioteca da faculdade e estadual não me oferecem tantos recursos para uma pesquisa mais detalhada sobre o assunto, é claro que…se eu precisar comprar 1 ou 3 livros eu irei comprar, mas não poderia deixar de perguntar antes se por acaso vc tem alguns desses da referencia em pdf. -estou em busca dele para facilitar meu estudo (aproveitando que eu estou de férias)
    Se tiver desde já agradeço se puder me enviar por e-mail: ivinycarla@hotmail.com

    >.~

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    • Olá, Iviny!
      Fico muito feliz pelo seu interesse. Ana Bolena é realmente uma dessas personagens que rendem uma boa discussão acadêmica. Infelizmente, a maioria dos livros escritos sobre ela não foram lançados em português, apenas em inglês. O melhor livro publicado no Brasil que posso lhe indicar é “As seis mulheres de Henrique VIII”, da Antonia Fraser, e o “Henrique VIII”, do Francis Hackett. Esse último é bem difícil de achar, mas no site da estante virtual há alguns exemplares disponíveis. Também não encontrei nenhum desses livros em formato pdf. Mas se lhe servir, há a minha monografia de conclusão de curso, publicada aqui mesmo. Segue o link para donwload: https://rainhastragicas.files.wordpress.com/2013/12/renato-tapioca-monografia3.pdf

      Abraço!

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  2. Olá, eu terminei de ler essa serie dr post sobre a Ana Bolena e só posso dizer uma coisa: Adorei o modo como descreveu a vida dela.
    Bom, foi por causa desse site incrivel que eu finalmente descobri quem era essa maravilhosa mulher que é citada na música do McFly (Transilvanya). Eu cada vez mais me encanto pela força que ela teve e como ela modificou o destino de uma nação. Pesquisar sobre ela e ler textos como esse que fizeram o amor que eu tinha por história renascer. Meus parabéns!

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    • *-* Ah! Depois de muita luta e pesquisa por ai e por alguns sites consegui encontrar algumas das bibliografias que servirão de base para o meu tcc e monografia. Encontrei alguns exemplares no: Estante Virtual e Submarino! Lá consegui: A irmã de Ana Bolena e A herança de Ana Bolena! e na Sub consegui: As seis mulheres de Henrique VIII (versão pocket). Já estou no processo de escrita do meu Tcc, e estou grata por vc ter enviado o link direcionado do seu, apesar que vc citou um pouco dos dois campos o histórico e o literário. Eu abordarei mais sobre o literário! Falando sobre Ana B. e sua representação feminina em romances históricos. Desculpe a demora em responder, mas é que em período de tcc tudo fica mais agitado que o normal kkkkk na verdade em qualquer período né?
      Grata pela resposta.

      Att.

      Eve

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    • Olá, Iviny.
      Fico muito grato pelo seu interesse. No Brasil dispomos de pouca bibliografia sobre a Ana Bolena, de modo que tive que recorrer a trabalhos não publicados aqui. Citei apenas 2 romances, mas apenas como recurso ilustrativo, uma vez que eles não poder ser usados como fontes para se extrair fatos. Se lhe interessar, também trabalhei com a representação de Ana Bolena no romance histórico “The Secret Diary of Anne Boleyn”, em meu tcc. Nesse caso, avaliei como o feminismo contribuiu parar uma nova interpretação acerca da imagem de Ana. Segue o link: (https://rainhastragicas.com/about/monografia/). Espero que goste.
      Abraço!

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