A maravilha de Fabergé: a história por trás dos ovos de páscoa mais luxuosos do mundo!

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

Em 1885, o czar Alexandre III da Rússia havia descoberto o presente ideal para a sua esposa, Maria Feodorovna. A czarina era uma mulher que gostava de presidir cerimônias solenes, ricamente paramentada, distribuindo sorrisos para todos. Era uma verdadeira amante dos bailes, de vestidos caros e, principalmente, de diamantes. Tendo isso em vista, o soberano resolveu surpreende-la com algo que ainda não possuía: encomendou a Peter-Carl Fabergé, joalheiro de origem germano-báltica que trabalhava em São Petersburgo, um “ovo de galinha” adornado com pedrarias que, ao se abrir, revelava outro tesouro escondido. O de Maria Feodorovna continha uma gema, que escondia em seu interior uma pequena ave montada num ninho de diamantes. O que Alexandre III não podia imaginar, contudo, é que naquele momento estava dando início a uma tradição na família imperial russa, que se repetiria todos os anos por ocasião da páscoa. Ao todo, ele e seu filho, o czar Nicolau II, encomendaram nada menos que 56 desses ovos a Fabergé, com a única recomendação de que eles contivessem uma “surpresa”. A criatividade do joalheiro e de seus artesãos para esses pedidos, porém, deu origem a algumas das peças de joalheria mais bonitas do mundo.

Inspirado em um original do século XVIII, o ovo de galinha tem uma casca exterior esmaltada branca opaca, abrindo com um toque para revelar uma primeira surpresa – uma gema de ouro amarelo mate. Este, por sua vez, contém uma galinha de ouro esmaltada.

Ovo do Renascimento, 1894: presenteado pelo imperador Alexandre III a sua esposa, Maria Feodorovna, este objeto de estilo renascentista é feito de ágata turva, sua cobertura é aplicada com treliça de ouro em esmalte branco opaco, com um quartzo de diamantes e um centro de rubi em cada cruzamento. Uma banda de esmalte vermelho divide as duas metades do ovo. A parte superior apresenta a data de 1894, em diamantes rosados.

Ovo da coroação, 1897: talvez o ovo mais icônico de Fabergé tenha sido presenteado pelo imperador Nicolau II a sua esposa, a imperatriz Alexandra Feodorovna, como lembrança de sua entrada em Moscou em 26 de maio, dia de sua coroação na catedral de Uspensky. Sua concha externa é feita de ouro multicolorido, decorado com esmalte translúcido amarelo guilloché e águias de esmalte preto com diamantes, um desenho que lembra o robe pesado de Pano de Ouro que ela usava na cerimônia. O monograma com jóias da imperatriz aparece no ápice do ovo sob um diamante de retrato, com a data na base. O ovo se abre para revelar uma surpresa na forma de uma réplica em miniatura de ouro esmaltado e diamante da carruagem original do século XVIII, que continha uma gota de esmeralda, mais tarde substituída por um diamante briolette amarelo (ambos perdidos).

Depois da morte do czar Alexandre III, em 1894, Fabergé continuou ao serviço da Coroa, criando muito mais do que ovos esmaltados adornados com diamantes. Por ocasião de seu noivado com a princesa Alice de Hesse, Nicolau II encomendou ao joalheiro um largo colar de pérolas que chegava à cintura da noiva, custando cerca de 175 mil dólares. Sendo assim, a nova czarina Alexandra podia se gabar de possuir a mais suntuosa coleção de joias da Europa, que incluíam diademas, colares, anéis, braceletes, broches, coroas e gargantilhas. A cada ano, esse imenso conjunto aumentava mais um pouco. Fabergé tinha ordens de reservar as peças mais bonitas de seu ateliê para a imperatriz da Rússia. Mas, diferentemente de sua sogra, Alexandra utilizava-as apenas em recepções formais. Nas celebrações pela páscoa, por exemplo, um grande festival, com comilanças, visitas e trocas de presentes acontecia em quase todo o país. Para alunos da escola de Ialta, membros da corte e a guarda imperial, os Romanov distribuíam simples ovos pintados pela czarina e suas filhas como lembrança. Já outros, recebiam os magníficos ovos incrustrados de pedrarias, confeccionados pelo mestre joalheiro.

No auge de sua popularidade, na virada do século XIX para o XX, a oficina de Fabergé em São Petersburgo empregava até cinco mil joalheiros, ourives e aprendizes. Suas lojas tinham filiais não só na Rússia, como também em Londres e Paris, onde faziam um enorme sucesso de vendas em ouro e prata, principalmente em serviços de mesa. Entre seus clientes internacionais estava o rei Eduardo VII da Grã-Bretanha, que exigia sempre peças únicas, sem duplicatas. Num único dia em 1898, diz-se que a Casa Fabergé recebeu nada menos que a visita dos reis da Dinamarca e da Grécia, da rainha da Suécia e da rainha Alexandra da Inglaterra. Mas foi como joalheiro que sua fama se consolidou. Segundo Robert K. Massie, “a genialidade de Fabergé foi ignorar a costumeira ênfase exagerada nas pedras preciosas e subordina-las à forma geral da peça” (2014, p. 193). Ao confeccionar uma cigarreira, por exemplo, seus artesãos primeiro aplicavam o esmalte, que podia ser de um azul translúcido, vermelho ou rosa, e depois adornavam o contorno com pequenos diamantes. Suas joias ainda incluíam figuras criativas como flores, animais zoológicos em miniatura, camponeses e cantoras. A composição final de cada uma dessas peças era uma verdadeira obra-prima da arte e do decoro.

Ovo dos lírios do vale, 1898: este ovo Art Nouveau de esmalte cor-de-rosa guilloché, dado de presente pelo imperador Nicolau II à imperatriz Alexandra Feodorovna, é praticamente envolto em lírios do vale (sua flor favorita) com pérolas e diamantes e foi projetado no seu estilo preferido. Está em quatro pés cabriolet entrelaçados com folhagem cravejada de diamantes. A surpresa: três miniaturas de suas filhas mais velhas, Olga e Tatiana, encimadas por uma coroa imperial cravejada de diamantes e rubis.

Ovo da Duquesa de Marlborough, 1902: este ovo-relógio está entre os melhores ovos “não-imperiais” criados por Fabergé. Foi adquirido por Consuelo Vanderbilt, duquesa de Marlborough, por ocasião de sua visita à Rússia em 1902. Feito de ouro multicolorido, diamantes com lapidação rosa, pérolas e esmalte translúcido rosa e branco guilhoché, o relógio possui um mostrador giratório, com uma serpente cravejada de diamantes, indicando a hora.

Ovo da Baía, 1911: presenteado pelo imperador Nicolau II a sua mãe, a imperatriz-viúva Maria Feodorovna, é inspirado em um autômato de pássaros franceses do século XVIII. De acordo com a fatura da Fabergé, compreende “325 folhas de nefrite, 110 flores de esmalte branco opalescente, 25 diamantes, 20 rubis, 53 pérolas, 219 diamantes de lapidação rosa e um grande diamante de lapidação rosa”. Quando a automação do relógio é acionada e acionada, um pássaro emplumado aparece, bate as asas, vira a cabeça, abre o bico e canta.

No caso dos famosos ovos de páscoa da família imperial russa, o czar confiava a escolha dos materiais e o design da peça inteiramente ao joalheiro. Desde que Alexandre III lhe encomendara o primeiro destes itens em 1885, a ideia de Fabergé era utilizar o formato do avo como uma casca que se abria, para revelar um presente escondido, que podia ser de natureza bem variada: de uma galinha empoleirada num ninho de diamantes, a uma cesta de flores silvestres com folhas de ouro. No alto do ovo podia sair também um galo a ritmos compassados, cantando e batendo as asas para marcar o horário. A cada ano, o joalheiro procurava se superar em beleza e genialidade. Em 1900, por exemplo, ele criou um ovo de esmalte azul, verde e amarelo, contendo delicadas incrustações de prata na casca com o desenho do mapa da Sibéria e a rota da Grande Ferrovia Siberiana. Uma vez aberto com um simples toque na águia bifurcada presente no topo da joia, ela revelava uma miniatura de 30 cm de cumprimento por 1,5 cm de largura dos cinco vagões e locomotiva da Transiberiana. “Manivela de direção, engrenagens duplas sob os vagões e outras partes móveis eram feitas com precisão, de modo que bastava dar voltas numa pequena chave de ouro… a locomotiva de ouro e platina, com um rubi brilhando no farol, realmente puxava o trem”, descreveu um observador (MASSIE, 2014, p. 194).

Com exceção do período durante a Guerra Russo-Japonesa de 1904-5, Nicolau II presenteava anualmente a esposa e os filhos com uma dessas genialidades criadas por Peter-Carl Fabergé. Na última semana da quaresma de 1912, a czarina Alexandra recebeu no palácio de Livádia um ovo de lápis-lazúli escuro, adornado com uma gaiola dourada flores, em cujo invólucro residia um retrato do czarevich Alexei cravejado de diamantes. Em outra ocasião, a imperatriz ganhou de presente um ovo de ouro esmaltado, adornado com minúsculas águias bifurcadas do brasão dos Romanov. Uma vez aberto, continha uma réplica dourada da carruagem utilizada por ela no dia da coroação, recriada nos mínimos detalhes. O design da peça podia variar bastante, com esmalte azul e/ou prateado, coberto com diamantes e/ou pérolas, contendo retratos do czar e de seus filhos, que se revelavam depois de acionado um pequeno dispositivo em formato de joia. Com a Revolução Russa, Fabergé abandou o país em 1918, disfarçado de diplomata e terminou seus dias na Suíça. Suas maravilhas criadas para a família imperial russa foram vendidas e/ou desmontadas pelos bolcheviques. Atualmente, algumas delas, incluindo os famosos ovos de páscoa, podem ser vistas em museus e galerias de várias partes do mundo!

O ovo da Ferrovia Transiberiana, 1900.

Ovo de Gelo Nobel, 1914: este ovo de esmalte branco platinado e translúcido é gravado com cristais de gelo sob o esmalte. Sua surpresa é um relógio de platina e cristal de rocha em forma de losango, decorado de forma semelhante. Foi encomendado pelo Dr. Emanuel Nobel, sobrinho de Alfred Nobel, uma das principais figuras da indústria do petróleo na época, que estava entre os clientes mais notáveis ​​da Fabergé.

Ovo da Ordem de São Jorge, 1916: presenteado pelo imperador Nicolau II a sua mãe, a Imperatriz viúva, este, um dos dois últimos ovos completos de Faberge, confeccionado em prata e esmalte branco opalescente, com enfeites adicionais, como os retratos em miniatura de Nicolau II e de seu filho Alexei, ocultos sob o Crachá da Ordem de São Jorge. Foi o único ovo que deixou a Rússia durante a Revolução, acompanhando a Imperatriz-viúva no exílio.

Referências Bibliográficas:

KING, Greg. La última emperatriz de Rusia: vida y época de Alejandra Feodorovna. Tradução de Aníbal Leal. Buenos Aires, Argentina: Javier Vergara Editor, 1996.

MASSIE, Robert K. Nicolau e Alexandra: o relato clássico da queda dos Romanov. Tradução de Angela Lobo de Andrade. Rio de Janeiro: Rocco, 2014.

MONTEFIORE, Simon Sebag. Os Románov: 1613-1918. São Paulo: Companhia das Letras, 2016.

RAPPAPORT, Helen. As irmãs Romanov: a vida das filhas do último tsar. Tradução de Cássio de Arantes Leite. Rio de Janeiro: Objetiva, 2016.

THE IMPERIAL EGGS – Acesso em 23 de abril de 2020.

16 comentários sobre “A maravilha de Fabergé: a história por trás dos ovos de páscoa mais luxuosos do mundo!

  1. Vários pensamentos e sentimentos surgiram ,enquanto lia,desde o encantamento pelas belas obras de arte,o espanto com tanta criatividade,a revolta pela miséria das pessoas do povo (Penso que até hoje é assim.)Que sustenta este luxo.Prefiro deixar a revolta para a vida toda e ,agora, só falar do meu encantamento com tudo que aprendi e que vi!! Agradeço esta DIVINA experiência ! I.M.

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  2. Incrivel a criatividade de Faberge.
    O texto nos relata e permite conhecer a história dos famosos ovos de Faberge e a descrição dos mesmos, a delicadeza ea riqueza de detalhes, razão do fascínio que causam

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  3. Pingback: A História do Ovo de Páscoa e o significado de outros símbolos pascais

  4. Lindas e ricas obras de arte. É pena que para mudarem o sistema político tenha havido tanta mortandade, incluindo as famílias reais.
    Estou a ler As Confissões de Maria Antonieta e o modo como trataram Luís XVI e Maria Antonieta foram o pior possível. Sabes que o filho do rei, sucessor do trono, acabou morrendo com 10 (ou 11) anos, num pequeno quarto cheio dos dejectos dele, fechado e sem acesso a janelas e infestado de pulgas e outros parasitas. Nauseabundo e com cheiro horrível. É um livro difícil de ler. Mataram nobres, clero e a eles próprios. Foi uma época horrível… Tenho de ver onde andava Plutão nessa altura.
    Beijinhos

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  5. Só se esqueceram de mencionar que a família Fabergé é originária de Alsácia, uma região francesa da qual foram obrigados a fugir pois eram cristãos protestantes, procurados para os matarem pelo regime da inquisição.
    O nome era FABRI, depois FABRY e por fim, chegados a Rússia, Fabergé.

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