‘Novo Mundo’: novela da Rede Globo mistura fato e ficção na História do Brasil

Por: Renato Drummond Tapioca Neto

A história do Brasil na primeira metade do século XIX apresenta um painel riquíssimo de personagens que até hoje povoam o imaginário coletivo, tais como D. João VI e sua corte nos trópicos, Dona Carlota Joaquina, D. Pedro I, entre outros. Suas vidas são narradas em diversos veículos de informação, que vão de livros, jornais e revistas, a posts na internet e até mesmo em filmes, seriados e novelas, como a que acaba de estrear na Rede Globo, “Novo Mundo”. Escrita por Thereza Falcão e Alessandro Marson, com direção artística de Vinícius Coimbra, “Novo Mundo” apresenta alguns dos principais eventos da história do país de uma forma bem-humorada, misturando fato e ficção, criando assim um enredo bastante original, espécie de alegoria do mito fundador do Brasil Independente, que se cristalizou na memória de muitas gerações.

Letícia Colin como a princesa real, Dona Leopoldina (foto: Divulgação).

A trama se inicia em agosto de 1817, com os preparativos para o embarque da princesa real, Dona Leopoldina, para o Brasil. Diferentemente de outras produções da mesma emissora, que representaram a esposa do príncipe D. Pedro como uma mulher desajeitada e macambúzia, a nova novela das 18:00 optou por construir uma personagem mais sofisticada, inteligente e educada, que sonha em conhecer essa terra tropical e seu suposto príncipe encantado. A escolha da atriz Letícia Colin para o papel de Leopoldina certamente desagradou a alguns telespectadores, justamente por ela não corresponder a algumas das supostas características físicas da princesa, o que de forma alguma compromete sua ótima atuação. Letícia empresta um sabor de romantismo ao papel, sentimento do qual Dona Leopoldina estava bastante imbuída quando embarcou para o Brasil.

Por outro lado, há uma certa insistência e reforço do estereótipo de D. Pedro I como “mulherengo”, em detrimento do homem inteligente que ele foi. Porém, como ainda estamos no primeiro capítulo, é possível que a trama se desenvolva de forma a ressaltar as outras qualidades do primeiro imperador do Brasil. Esperemos então para ver! A caracterização do ator Caio Castro para o papel ficou relativamente boa. Fisicamente, seu porte se assemelha ao que o príncipe possivelmente tinha em vida. Suas falas carregadas de sotaque luso foi outro ponto positivo, apesar de que, vivendo tantos anos no Brasil, D. Pedro certamente tinha uma conversação menos carregada de fonemas do idioma de sua pátria de nascimento do que, por exemplo, seu pai, D. João VI, interpretado por Leo Jaime.

Algumas das personagens de “Novo Mundo”, interpretadas pelos atores Chay Suede, Isabelle Drummond, Gabriel Braga Nunes e Caio Castro (foto: divulgação).

Com efeito, acredito que esse seja um dos aspectos mais caricatos de “Novo Mundo”: a miscelânea de sotaques de diferentes nações, não só através dos representantes da família real e da corte portuguesa, como também o espanhol castelhano de Dona Carlota Joaquina (Debora Olivieri), e o alemão de Dona Leopoldina. Além, é claro, do português local, falado pelos nativos do país. Da mesma forma, é possível notar um cuidado com o figurino da novela, que reformula os trajes da moda império, utilizada nas primeiras duas décadas do século XIX. A figurinista Marie Salles e equipe fizeram um ótimo trabalho de releitura das peças de roupa, tanto das que eram utilizadas pela nobreza, como pela plebe. Já sobre os cenários, estes variam de palácios requintados a mansões senhoriais, incluindo até um navio. A moldura ideal para uma produção que não tem por intenção ser fiel aos fatos históricos, e sim recria-los.

Prova disso é a inclusão de personagens novas, como as do casal de protagonistas, interpretados por Isabelle Drummond e Chay Suede. Isabelle da vida à Anna Millman, a professora de português que acompanha Dona Leopoldina em sua viagem para o Brasil. Na véspera do embarque, ela conhece Joaquim Martinho (Suede), um ator falido que, por um golpe do destino, também acaba à bordo do navio, rumo ao novo mundo. Uma atração logo floresce entre os dois, embora muitos desafios se coloquem entre a felicidade do casal. O primeiro deles é a diferença de posições sociais. O outro estaria personificado na personagem do oficial inglês Thomas Johnson (Gabriel Braga Nunes), que também se apaixona por Anna e está disposto a tudo para consegui-la.

O casal de protagonistas da novela, interpretador por Isabelle Drummond e Chay Suede (foto: divulgação).

Sendo assim, “Novo Mundo” é um prato cheio para quem gosta de histórias de aventura e romance. Há o namoro quase impossível da mocinha rica com um desvalido, e as artimanhas de um vilão para desuni-los. Diga-se de passagem, um enredo que seria quase piegas, não fosse a presença de um pano de fundo riquíssimo, como o do primeiro reinado. Emolduram esse retrato a presença de uma corte caricata, onde a princesa romântica se prepara para atravessar o Atlântico para se casar com um homem que ela nunca viu pessoalmente, e conhecer uma família bastante curiosa, vivendo numa terra tropical que, em diversos aspectos, se distancia da Europa e de sua Viena natal.

Por fim, é preciso ressaltar que, como produto da ficção, a trama da novela não possui compromisso com a veracidade dos fatos. A história do primeiro reinado e da vinda da princesa real Dona Leopoldina para o Brasil em 1817 serve apenas como palco para um enredo original, que preza pela novidade e pela surpresa. Portanto, não se deve procurar comprovação da história numa obra como essa. Qualquer intenção nesse sentido seria uma verdadeira perda de tempo. O discurso de “Novo Mundo” não é o da realidade, e sim o da fantasia, um universo em que as possibilidades de criação são infinitas e onde o sonho ganha cores e formas através da mágica da teledramaturgia.

11 comentários sobre “‘Novo Mundo’: novela da Rede Globo mistura fato e ficção na História do Brasil

  1. CONCORDO com o seu comentário, sobre as indumentarias! O que não gosto é do “cabelo solto” da atriz Izabelle Drummond! Nada a ver! Sera que vão fazer o mesmo com a Domitila de Castro? Vão contar que quando ela conheceu D. Pedro, ele já era amante da irmã dela (Maria) e que eles já tinham um (a) filho (a)? SOU UM FÃ INCONDICIONAL DE SEU BLOG!

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    • o cabelo liso dela foi escolhido provavelmente para representar uma mulher fora dos padrões da época, principalmente no modo de pensar. acredito que poderiam ter escolhido melhor, mas foi uma forma de apresentar a personalidade dela externamente, já que ela já mostrou muitas atitudes que não seriam lá muito comuns para um moça daquela época.

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  2. Parabéns pelo artigo, mas não vejo a hora de termos um filme muito bem dirigido sobre D.Pedro, por que vi alguns da década de 80 que deixou muito a desejar, vamos torcer para a novela apresentar fatos mais reais, mesmo dentro da dramaturgia.Adoro seu blog.

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  3. Contudo, embora misture realidade com ficção, muitos fatos que acontecem na novela são verdadeiros.
    Pode ser perda de tempo, mas assisto a novela e comprovo através de livros a veracidade dos fatos.

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  4. Adoro essa novela. Muito catvante. Não perco um capítulo e olha que é a primeira novela que assisto de muitos anos. Parabéns a todos.

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  5. …..Saindo um pouco dos estereotipos da trama, acho que o brasil perdeu uma chance de se tornal uma nação global ao declarar a independência…Em hipótese nenhuma deeria deixar o rei voltar a Portugal, tínhamos conseguido a capital de um Imério Transcontinental de mão beijada….e na ocasião os portugueses europeus não conseguiriam reverter essa situação…Enfim, um oportunidade perdida….Gostaria que comentassem o fato de que se o Rio permanecesse capital, como estariamos hoje? S
    erá possível fazer essa projeção?

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