Comentários da série “The Tudors” – Capítulo 1×04

“Em Inglaterra, uma triste e jovem princesa está prestes a fazer longa viagem marítima para se casar com um rei que jamais vira, mas a quem todos lhe diziam ser doente e velho. Que infeliz destino aguarda Margareth Tudor, enquanto seu irmão saboreia cada aspecto da vida na corte, literalmente. Entretanto, é chegado o momento de novas revelações, e no tabuleiro de xadrez que se transformou a monarquia, a rainha está prestes a ser derrubada pelo rei, que se tomou de amores pela exuberante filha de um simplório peão”. 

O jogo de alianças matrimoniais sempre fora uma política inerente à instituição monárquica. Com efeito, um rei sempre reforçava os laços diplomáticos de seu país com um vizinho, ao oferecer a mão de uma princesa nacional em casamento ao monarca estrangeiro. No quarto capítulo da primeira temporada de “The Tudors”, Henrique VIII (Jonathan Rhys Meyers) embarca sua única irmã, Margareth (Gabrielle Anwar), para o pequeno reino de Portugal, contra a vontade da mesma. Esse aspecto do enredo, no entanto, é bem incompatível com a própria política inglesa apresentada na série, pois, até então, pudemos observar que a vontade do rei era aliar-se a alguma potência europeia, como já o fizera com a França, e agora com a Espanha. Nesse caso, não seria tolice desperdiçar uma belíssima princesa, enviando-a para uma corte infeliz, e ainda por cima, com um soberano velho e doente?  Em minha opinião, é claro que sim!

A mulher do século XVI apresentada como leviana e movida por seus instintos sexuais: princesa Marguerite de Navarra (Sarah James Later).

A mulher do século XVI apresentada como leviana e movida por seus instintos sexuais: princesa Marguerite de Navarra (Sarah James Later).

A explicação para a atitude de Henrique foi dada no capítulo anterior, quando ele diz à irmã que Portugal era um reino de hábeis navegadores e muito rico em especiarias. Mas, como a história em torno do personagem Margareth se baseia na vida da princesa Maria (irmã mais nova do verdadeiro Henrique VIII), então é possível ver como a narrativa, nesse aspecto, se distancia da história original. Maria foi dada em casamento a Luís XII da França, uma nação à qual o rei da Inglaterra tinha pretensões políticas, ao contrário de Portugal, que não lhe excitara o menor fascínio. Dessa forma, julgo essa passagem em “The Tudors” como uma manobra mal feita, que poderia muito bem agradar ao telespectador mais leigo no assunto, diferentemente daquele que conhece os acontecimentos conforme estes procederam.

Destarte, as cenas gravadas dentro do navio com o Henry Cavill e a Gabrielle Anwar foram muito mal feitas, principalmente os efeitos especiais, como a representação do oceano e da cidade de Lisboa, que ficaram bem artificiais. Outra coisa que também ficou forçada foi o envolvimento sexual entre estes dois atores: no início, até que foi legal ver a Margareth negando a atração que sentia por Charles Brandon, mas quando o sexo passou a ser um elemento na relação entre eles, o clima das cenas deixa de ser sedutor para transformar-se em ridículo. Acredito que o caso entre ambos poderia ter se desenvolvido de forma mais natural e espontâneo, como acontece com a Natalie Dormer e o Jonathan, em vez de tão abrupto.

Natalie Dormer (Ana Bolena) mostra seus ótimos talentos como dançarina nesse capítulo.

Natalie Dormer (Ana Bolena) mostra seus ótimos talentos como dançarina nesse capítulo.

Por falar nos personagens de Dormer e Meyers, neste capítulo eles estão mais envolvidos emocionalmente, o que ficou bem interessante. Como duas naturezas selvagens, Henrique procede calmamente com o alvo de suas paixões, pois sabe que ela pode lhe escapar, tal como uma corça foge do caçador. Por isso, ele a atrai com joias, cartas amorosas, em que assinava como “seu humilde servo” e suplicava por um encontro privado. É curioso notar que com Ana o rei é muito mais cauteloso do que com as suas outras amantes, mesmo ela sendo, modéstia à parte, uma ninguém. Diferentemente de sua procedência para com mademoiselle boullan, Henrique toma liberdades com a irmã de seu rival, Francisco I: princesa Marguerite de Navarra (interpretada por Sarah James Later, pouco qualificada para o papel, em minha opinião).

Contrariando os registros históricos, Michael Hirst (escritor da série), resolve mandar aquela distinta dama para a corte inglesa, onde ela tem uma noite de prazer com o rei. Sobre esse aspecto, sou obrigado a concordar com Susan Bordo, quando esta diz que “The Tudors eclipsou a diferença significante entre Marguerite de Navarra e seu irmão libidinoso” ao mostra-la como uma mulher lasciva, em vez da princesa religiosa e erudita que realmente era (BORDO, 2013, p. 37). Essa, por sua vez, é uma das características que mais me incomodam na série: apresentar as mulheres da corte como levianas e apenas movidas pelos seus instintos sexuais. Nessa primeira temporada, a única que destoa desse quadro é Catarina de Aragão (Maria Doyle Kenedy) que, como bem fez notar o Cardeal Wolsey à Sir Thomas More durante o torneio de justa encenado neste capítulo, era uma figura extremamente querida pelo povo, ou, de acordo com a fala de More, “talvez achem que ela é o que uma rainha deve ser”.

Depois de sofrer um grave acidente, Henrique VIII (Jonathan Rhys Meyers) toma uma grande resolução em sua vida.

Depois de sofrer um grave acidente, Henrique VIII (Jonathan Rhys Meyers) toma uma grande resolução em sua vida.

Dentre as partes mais interessantes deste episódio, gostei bastante de terem evidenciado o título que Henrique ganha do papa após publicar seu livro contra a pregação de Lutero: o de Defensor da Fé. Curioso também foi ver a Natalie Dormer dançando esplendidamente na corte, para deleite da plateia; podemos perceber pela própria expressão da atriz que ela estava se divertindo ao gravar aquela coreografia, muito bem feita, diga-se de passagem. Por outro lado, a cena final, com a princesa Margareth assassinando o rei de Portugal para, assim, retornar à Inglaterra, foi muito cruel, e só demonstra a interpretação equivocada que a série faz sobre a mulher, citada mais acima. A própria representação da corte de Lisboa foi equivocada, e isso só demonstra o quanto que a história dos reinos ibéricos é mal explorada por essas produções modernas.

Com efeito, antes de encerrar meus comentários sobre o quarto capítulo desta temporada de “The Tudors”, eu preciso confessar que mal esperava a hora do James Frain aparecer no papel de Thomas Cromwell. Esteticamente falando, ele pouco se assemelha ao personagem original, mas, como veremos mais adiante, sua participação será decisiva nos próximos capítulos, uma vez que Henrique (depois de quase morrer acidentalmente e perceber que não tinha um sucessor), conclui que todas as desgraças de sua vida ocorreram por ter se casado com a viúva de seu irmão. Para o espanto do cardeal Wolsey (Sam Neill), a ele fora confiada à tarefa de conseguir o divórcio para seu rei, algo que, por sua vez, estava além de seus poderes como chanceler de Inglaterra. Mas qual seria a suplente de Catarina de Aragão? Essa pergunta, contudo, só será respondida nos próximos episódios, embora muitos de nós já saibamos quem seja…!

Renato Drummond Tapioca Neto

Graduando em História – UESC

5 comentários sobre “Comentários da série “The Tudors” – Capítulo 1×04

  1. Este 4 capítulo confesso é o q menos gosto da 1 temporada exatamente por essa recriação equivocada da Corte de Portugal e toda a história da Margaret e do Charles. Isso prova q até Michael Hirst n fugiu do estereótipo de parodiar os portugueses (q nossas próprias produções históricas tbm adoram fazer infelizmente), o q é uma pena. Quanto a Corte Tudor tudo me agradou, a cada vez mais intensa relação entre Henry e Ana, de novo a química entre JRM e Natalie Dormer entra em ação! Realmente Natalie estava belíssima na cena da dança, e realmente parecia se divertir e encantar a todos! Outra coisa q eu sempre noto, tanto nos posters promocionais, quanto na relação intensa entre Henry e Ana, é o destaque para o pescoço da nossa querida Bolena, nesse ep por exemplo em um ataque de ciúme por Ana (q só estava conversando com seu irmão George) ele segura rudemente seu pescoço, Michael Hirst e suas mensagens subliminares,kkkkkkkk! E o outro irmão Bolena apareceu, rápido, mas já deu para perceber a dinâmica entre os irmãos (o q é sempre bom ressaltar, ainda mais por causa de acusações falsas futuras…). Gosto muito do George, na vdd dos três irmãos Bolenas, mesmo as adaptações sempre o tratarem com o mau-caráter e estuprador. Considero os irmãos Bolenas como espíritos livres q infelizmente foram aprisionados pelas ambições de sua família.
    Ahh James Frain e sua ligação com os Tudor ( ele tbm fez o filme Elizabeth, e recentemente a série The White Queen q fala da Guerra das Rosas), doida por mais cenas dele! Bjs, ótima análise!

    Curtir

    • Muito Obrigado, Camila. Realmente, a câmera da muito destaque para o pescoço da Natalie, na certa para enfatizar o destino da personagem. Outra coisa interessante sobre os irmãos Bolena é que tanto na primeira quanto na segunda temporada, não me recordo de ver George e Maria contracenando juntos, mas apenas separados. Estranho isso… rsrs Abraço!

      Curtir

    • Oi Tila. Conforme eu demonstrei na resenha do capítulo 4, Henrique VIII tinha duas irmãs, Margareth e Maria, sendo que a história desta última foi a que serviu de inspiração para a personagem Margareth em The Tudors. No caso da princesa Maria, ela se casou com o rei de França, e não com o de Portugal. Mas naquele tempo, Luis XII já estava muito velho e não há qualquer indício de que Maria o tenha assassinado. Quanto à outra irmã de Henrique, a real Margareth, ela se casou com o rei da Escócia, com quem teve um filho chamado Jaime, que mais tarde se tornou rei Jaime V 😉

      Curtir

  2. Portugal estava longe de ser um reino sem importância no século XVI apesar de seu território ser pequeno, Portugal era de longe o reino mais rico da cristandade, o próprio Carlos V era casado com uma princesa portuguesa.

    Curtir

Deixe um comentário